Faz já muito tempo que
moravam em subúrbio do Rio dois jovens pertencentes a famílias vizinhas, entre
os quais diário acabou criando verdadeira amizade.
Da amizade ao amor, foi um
passo e, um belo dia, um olhar mais terno, um sorriso, um encontro furtivo e
eis que o amor explodiu forte e sincero no peito de Jorge e no coração de
Marieta – os dois jovens vizinhos.
Eram pobres os dois mas que
importava?... Lá na serra, ainda estava de pé a choupana em que Jorge nascera e
se criara. Iriam viver lá!
O altar, a festinha em casa,
a despedida na estação da estrada Ferro e foram-se os dois certo dia, rumo à
serra em busca da felicidade.
A casinha em plena mata
abrigou, por longo tempo, o que se podia chamar um casal feliz. Jorge,
dedicando-se com afinco ao trabalho alcançara boa situação na fábrica; enquanto
que Marieta, embora também trabalhando na mesma fábrica não se descuidava do
trato da casa e do carinho devido ao marido.
Não possuíam filhos, e faina
era grande e a localidade era erma e triste; mas os dois jovens sabiam com
distrair o espírito. Aos domingos após a santa missa rezada na capelinha do
povoado, tomavam o trem e subiam a Petrópolis para passar o dia, ou desciam ao
Rio em visita a parentes.
Entretanto, uma notícia
recebida do Rio viria transtornar completamente Jorge. Falecera um tio rico,
legando-lhe uma pequena fortuna.
- Era o que nos faltava;
agora você poderá ter, enfim, o conforto que merece. – dizia ele, todo
satisfeito, à sua Marieta.
A notícia pertubara-o tanto
que, ao invés de ficar chocado com a morte do parente. Joprge se alegrara com a
perspectiva da herança.
Marieta, porém, recebeu a
novidade friamente. Teve como que um pressentimento cruel...
- Não vá buscar esse dinheiro que não nos faz
falta. – dizia ela súplice ao esposo. Continuemos a viver, aqui neste cantinho,
a nossa vida simples e sossegada.
Mas o rapaz a nada atendeu e
foi para o Rio de Janeiro.
Passou um dia sem que Jorge
voltasse. Era a primeira vez que os dois se separavam de maneira que a espera
para Marieta foi deveras penosas
Na manhã seguinte, muito
cedo ainda, já se achava ela, na pequenina estação do Meio da Serra, à espera
do primeiro trem. Mas Jorge não chegou nele, nem nos outros. E foi muito
abatida que voltou a noite, para o lar.
- Está retido no Rio por causa das
complicações do inventário, dizia ela para si mesma, tendo se acalmar.
Mas, vinha-lhe logo a dúvida: por que não
avisava?
Outra noite de agonia,
transcorreu e novo dia despontou, trazendo talvez para Marieta a volta de
Jorge.
Mas qual... ele não voltou
naquele dia, nem nos que se seguiram.
Na casinha da serra, tudo é
agora silêncio e tristeza. Ninguém mais vê, nem ouve a desolada Marieta.
A crueldade do golpe sofrido
parece ter-lhe tirado a vontade e o raciocínio; já não trabalhava, não falava,
nem parecia preocupar-se com o destino do marido.
Passa-se, porém outra
noite... amanhece... lá fora, na floresta, gorgela a passarada, saudando o sol!
Súbito, estala na rua da
casinha uma gargalhada... uma gargalhada... estridente, nervosa, diferente...
E Marieta que ora chora
baixinho, ora balbucia palavras sem nexo, ora ri com estéprito.
A coitada não resistira a
dor estava louca!
Mas eis que ela sai, enfim
de casa, rumo a estação de trem, mal ouvira os primeiros apitos de trem
galgando a serra. Percebe-se que entre outras coisas, ela murmura: - “Meu Deus,
como não me lembrei de procurar noticias dele nos jornais? Ou então: “ Os
jornais devem dizer o que houve com ele.”
Chegou a primeira composição
de trem e Marieta bem próxima dos vagões, braços erguidos e olhar esgazeado,
grita para os passageiros: “Me dá jornal!... me dá jornal!...”
Tão fora de si estava ela,
entretanto, que nem reparava que os passageiros, condoídos atendiam ao apelo,
atirando-lhe em quantidade, os jornais já lidos.
E assim faz com as diversas
composições de trem que subiam a serra -
“Me dá jornal, por amor de Deus!...” pedia ela incessantemente.
Os garotos da localidade
atraídos pela cena apanhavam os jornais e os oferecia a Marieta que,
entretanto, nem olhava para eles.
Desaparecido o último vagão,
a louca, recolhe-se à casa. E dali em diante, na sua loucura mansa, a coitada
mal ouvia os apitos das locomotivas e corria para junto do leito da estrada e
iniciava seu peditório. Sempre indiferente aos jornais atirados!
Mas os garotos
acostumaram-se a apanhar esses jornais que iam vender aos pequenos comerciantes
da povoação.
De Jorge nunca mais houve
noticia. E Marieta pediu jornal durante alguns anos morrendo, tristemente, em
sua encantada casinha da serra.
O apelo de Marieta, porém
perpetuar-se-ia na voz das crianças que até hoje, à passagem dos trens entoam o
coro plangente tão nosso conhecido: “Jornal... nal!... nal!... nal!... nal!...”
Mais uma história da nossa História
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