sábado, 8 de junho de 2013

AS RAÍZES DE PETRÓPOLIS

Maria Luíza Salgado

O estudo da viação ligando o Rio de Janeiro às regiões das minas, a partir do século XVI, tem sido objeto de muitos estudos e grandes historiadores ainda não chegaram a conclusões  definitivas sobre o assunto. Entretanto á certo que em 1704, Garcia Rodrigues Paes abriu um caminho, também conhecido como Caminho do Couto ou Caminho Novo das Minas, assim demarcado: partindo-se do Rio de Janeiro, por via marítima, chegando ao Porto do Pilar, ao fundo da Baia da Guanabara, subindo a Serra do Couto até as Roças de Marcos da Costa, seguindo até Alferes, dali à Pau Grande, depois Cavarú, Encruzilhada, Paraíba do Sul, Paraibuna, Juiz de Fora, Barbacena, Queluz, Venda Nova  e enfim, Vila Rica (Ouro Preto). Era um caminho muito acidentado, no qual gastava-se cerca de 25 e 30 dias de ponto a ponto, oscilando o tempo despendido conforme as condições climáticas. Garcia Rodrigues Paes recebeu como recompensa pelo seu hercúleo esforço e pesados encargos por ele assumidos, quatro quadras de sesmaria e a concessão do pedágio sobre a Passagem do Rio Paraibuna.
  Vinte anos depois, o Governador Aires Saldanha e Albuquerque reconhece ser uma necessidade abrir-se uma variante no Caminho Novo, com a finalidade de encurtar e dar melhores condições àqueles trajeto. O Sargento-Mor Bernardo Soares de Proença propõe e é aceito o projeto de se abrir uma atalho, partindo do Rio, alcançando por mor o Porto da Estrela, Vila do Inhomirim, subindo a Serra da Estrela até seu alto e de lá, através uma trilha que passava entre a Serra do Frade e a da Taucaya Grande atravessavam o Córrego Seco, passavam pelo Itamarati e acompanhando a direção seguida pelas águas do Rio Piabanha, atingiam Paraíba do Sul. Dali para frente, seguiam o mesmo trajeto do Caminho Novo de Garcia Rodrigues Paes. Essa variante diminuía o tempo da viagem em cerca de 4 a 5 dias, oferecendo melhores condições, pois o terreno era menos acidentado. Proença recebe, pelo importante serviço prestado a El Rey, uma data de terras correspondente ao que seria hoje o Primeiro Distrito de Petrópolis, à qual deu o nome de Fazenda do Itamarati, cuja sesmaria foi reconhecido em 09-10-1721. Nesse mesmo dia foi também confirmada a posse do capitão Luiz Peixoto da Silva, seu provável auxiliar na empreitada, e suas terras seriam onde hoje se encontra a Fazenda da Samambaia, limítrofe às terras de Proença.
  A afirmação segundo a qual o povoamento do novo traçado do Caminho das Minas agora conhecido como Caminho do Inhomirim, passa a ser feito do interior para o litoral, sendo alguns de seus habitantes, pela comprovação das datas das primeiras concessões das glebas, a partir dos limites de Paraíba do Sul: em 1723 tem reconhecidas suas sesmarias Luiz Antunes Álvares, Ambrósio Dias Raposo, Francisco Fagundes do Amaral e em 1725, Jorge Pedroso de Souza e José Borges Raymundo. Em 1735, José Ferreira da Fonte teve confirmada sua sesmaria conhecida como Roça do Secretário. Boaventura da Cruz Alvares recebeu , também nessa época, as terras que seriam mais tarde conhecidas como o Município de São José do Vale do Rio Preto. Esses foram os primeiros moradores que se estabeleceram nas atuais localidades de Sebollas, Fagundes, Secretário e S. José do Vale do Rio Preto.
  Em torno do eixo constituído, pelo novo caminho margeando o Rio Piabanha, foi se desenvolvendo a malha viária, constituída pelos atalhos vicinais, unindo as fazendas e criando, por sua vez, novas ramificações, dando  origem às atuais estradas que interligam todo o município.
 Em 1743, Francisco Moniz de Alburquerque toma posse de sua sesmaria, na qual já havia construído casa de moradia denominada Sítio da Ponte, (atual Casa do Padre Correia) situada na confluência dos Rios Piabanha e Moro. Suas terras limitavam-se com a concessão obtida por Antonio da Silveira Goulão, pelo poente. As terras de Goulão, denominadas Fazenda Rio da Cidade, partiam da confluência do Rio da Cidade com o Rio Araras e faziam testada com o Rio Piabanha. Estes foram alguns dos mais antigos moradores da região.
  Oriundo das lavras auríferas da região das minas do Goiazes, mais precisamente do Arraial de Meia-Ponte (atual Pirenópolis), tendo feito parte do grupo de seus fundadores juntamente com Bartolomeu Bueno da Silva, o português Manoel Correya da Silva veio a ser o maior proprietário de terras da região, no século XVIII, provavelmente levado pelo interesse futuro de aqui também formar um núcleo habitacional como já o fizera em Goiás.
  Por volta de 1749, adquire aos herdeiros de Francisco Moniz de Alburquerque, o Sítio da Ponte, este já em mãos de Luiz Peixoto da Silva, que, por intermédio de seu procurador sargento-mor Antônio Carvalho de Lucena assina escritura de venda para Correya.
  Em 1750, Correya casa-se com Brites Maria da Assunção Goulão, filha de Manuel Antunes Goulão, seu vizinho.
  Em 1752, adquire de seu sogro a Fazenda do Rio da Cidade, limítrofe à sua propriedade, e vai residir na sede desta. Transforma o antigo Sítio da Ponte, em Posse de Manuel Correya, passando esta a servir de hospedaria, armazém e estação de remonta na atividade de mercador-tropeiro, à qual passou a se dedicar ao se afastar da mineração. Percorrendo, o trajeto Rio – Região das Minas, vendia a seus moradores utilidades e alimento, auferindo grandes lucros e construindo, assim, sólida fortuna.
  Compra, a seguir, A Fazenda da Arca de Noé (atual Arcas) pertencente aos herdeiros de José Fragoso, cujas terras também limitavam-se com as que pertenceram a Francisco Moniz Alburquerque.
  Por último, em 1780, adquire a sesmaria de Antônio da Sylveira Gularte Engenho das Terras Frias de Nossa Senhora da Soledade (atual Fazenda de Santo Antônio), mas quem ultima transição é sua viúva Brites Maria Assunção Goulão, representada por seu genro Pedro Gonçalves Dias.
  Correya, sem nunca ter sido sesmeiro na região e sem ter herdado nenhuma gleba, tornou-se, assim, proprietário de mais da terça parte do atual Município de Petrópolis. Quando morreu, em 1784, deixa dividido seu latifúndio entre quatro de seus cinco filhos vivos.
  Fazenda Engenho da Soledade (atual Fazenda de Santo Antônio) a Agostinho Correya da Sylva Goulão;
  Posse de Manuel Correya (atual Fazenda do Padre Correia) ao padre Antonio Thomaz de Aquino Correya Goulão;
   Fazenda Belmonte (atual Samambaia) a sua filha Maria Brigida Correya da Sylva Goulão Dias, casada com Pedro Gonçalves Dias;
  Fazenda Olaria de Colares (atual Castelo de São Manoel) a sua filha Arcângela Joaquina Correya da Sylva da Cunha Barbosa, casada com José da Cunha Barbosa.
  D. Brites, viúva de Manuel Correya, entrou na posse de considerável fortuna e fez grandes melhoramentos na Posse do Correya  que, daquela época em diante, passou a ser conhecida como Casa do padre Correia. Ampliou a casa, dotando-a com uma bela capela e para lá se mudou, abandonando a sede da Fazenda do Rio da Cidade, passando a residir em companhia de seu filho padre.
  Constrói para seu outro filho Agostinho Correya  da Sylva Goulão, recém chegado de Coimbra, a casa do Engenho  da Soledade, com sua linda capela. Edifica a nova sede da Fazenda Belmonte, também com capela ao lado, transformado sua antiga sede em venda, estrebaria e depósito, aproveitando a boa situação que esta desfrutava à beira da Estrada dos Mineiros. Reformou a Fazenda da Arca de Noé, inicialmente para seu filho Luiz Joakim, mas com a definitiva permanência deste em Coimbra, onde tornou ordens, destinou-a então à sua filha Maria Brigida Correya Dias, casada com Pedro Gonçalves Dias, Luiz Joakim deve ter recebido sua parte da herança paterna em moeda corrente, tendo permanecido para sempre em Portugal.
  Por último, divide as terras da Fazenda do Rio da Cidade entre seus filhos, o Padre Correya e Arcângela Joaquina e levanta a sede da Fazenda Olaria de Colares, destinada a esta última, transferindo para sua respectiva capela o altar mais antigo de toda região da Serra, consagrado a Nossa Senhora do Amor de Deus, proveniente daquela propriedade que pertencera a Manuel Antunes Goulão, cuja casa é definitivamente abandonada.
  Dona Brites morreu em 1800.
  Essas terras, cuja produtividade era baixa devido à sua composição pobre e à topografia muito acidentada, apresentavam, contudo, duas grandes vantagens: a proximidade da Capital e um clima de excepcional salubridade, e por isso mesmo, a tendência era desenvolver a uma urbanização crescente.
  Com o gradativo desaparecimento dos respectivos proprietários, essas terras passam a ser divididas e subdivididas entre seus herdeiros, e, nas gerações seguintes, os limites destas primitivas fazendas já eram completamente irreconhecíveis.
  Sobraram, entretanto, três marcos arquitetônicos de antigas grandezas: as sedes da Samambaia, da Santo Antônio e da Padre Correia, todas três inscritas no Livro de Tombo do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. As outras sedes fora demolidas.
  Em 1822, D. Pedro I esteve na Serra dos Correyas como ele designava aquela propriedade do Padre Correia; apreciou tanto o local que, durante os oito anos que permaneceu no trono, ali passou os verões.
  Também ali se hospedaram a Arquiduquesa D. Leopoldina, Imperatriz do Brasil, assim como seus filhos e damas de honra. A Princesa D. Paula Mariana várias vezes passou temporadas na Serra dos Correias, na esperança de obter melhoras para sua saúde bastante precária.
  Com a morte de D. Leopoldina, quem passou a usufruir do bom clima e da hospitalidade da aprazível casa solarenga foi D. Domitila, a Marquesa de Santos, e sua dilha Isabel Maria, a Bela, Duquesa de Goiás.
  Por último, D. Amélia de Leutchtenberg, a segunda Imperatriz do Brasil. Deve-se à ela a insistência em fazer D. Pedro I adquirir a Fazenda do Córrego Seco. A principio, o Imperador queria comprar a Fazenda do Padre Correya ao seu herdeiro, o cônego Alberto da Cunha Barbosa, que ali residia, e em cuja companhia sua mãe D. Arcângela Joaquina, passava os verões, saindo de sua chácara no Inhaúma e subindo a serra, fugindo do calor carioca. O Imperador fez à ela uma proposta, mas esta escusou-se dizendo não querer passar a estranhos a propriedade. Indicou-lhes, então, a Fazenda do Córrego Seco, que se encontrava hipotecada a seu filho cônego Alberto, cujo dono era José Vieira Afonso. O Imperador acatou a sugestão e adquiriu o que viria a ser a Cidade de Petrópolis, pela quantia de vinte contos de réis, em 1830. Pouco depois renunciou ao trono.
  As terras dos descendentes de Manuel Correya entraram em decadência acelarada, depois de 1888 e fragmentaram-se nos distritos que hoje ali se instalaram:
2° Distrito: Correias, Bonfim, Calembe, Nogueira, Araras, Malta;
3° Distrito: Benfica, Boa-Esperança, Serra das Araras, Itaipava, Pedra Negra, Cuiabá, Cantagalo.
  Em torno desse núcleo inicial, foi se desenvolvendo a colonização desse território e a partir de meados do século passado, com a abertura da Estrada União Indústria, novos centros de povoamento foram se formando, como São José do Vale do Rio Preto, hoje emancipado do Município de Petrópolis.
  Os últimos distritos constituídos compreendem as localidades de:
4° Distrito: Augusto Silva, Pedro do Rio, Secretário, Cachoeira, Taquaril, Vale das Videiras;
5° Distrito: Brejal, Posse, Alberto Torres, Tristão Câmara.
Região de clima privilegiado e cumulada com muitas das mais belas paisagens do Estado do Rio de Janeiro, incrustada na Serra do Mar, com várias áreas cobertas pela Mata Atlântica, com suas trilhas pitorescas e seus  cursos d’água serpenteando nas matas, com inúmeras cachoeiras e poços naturais, cada dia que passa, afirma-se como pólo turístico dos mais atraentes, contrapondo-se às belezas da orla marítima, como uma opção natural.
  Nunca deixou de corresponder à descrição que dela fez a Arquiduquesa D. Leopoldina, Primeira Imperatriz do Brasil, em carta enviada a sua tia, residente na Corte austríaca:

“O país é encantador, cheio de paisagens deliciosas, de montanhas muito elevadas, de campos verdejantes, de florestas das mais raras e magníficas árvores, semeada das mais belas flores, onde se vêem esvoaçantes pássaros, incomparáveis devido à sua plumagem...”

Mapa de Petrópolis.

Referência Bibliográficas:
Mapa Turístico Município de Petrópolis - 2 ° Distrito CASCATINHA - Edição de 1996 - PETROTUR.

Um comentário:

  1. PARABÉNS PELA INICIATIVA DE CRIAR UM BLOG PRÁ FALAR DA NOSSA TERRA; TEXTO CLARO E OBJETIVO.
    CASO QUEIRA CONHECER O MEU BLOG "LETRAS QUE SE MOVEM", ENTRE E FIQUE A VONTADE.
    UM ABRAÇO,
    Sandra Mayworm

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