terça-feira, 25 de junho de 2013

A BICICLETA EM PETRÓPOLIS

Alcindo Sodré

 A crônica petropolitana registra vários acontecimentos interessantes relativos à prática da bicicleta sobretudo no antigo Morro da Igreja( Catedral São Pedro de Alcântara) e Palácio de Cristal. Muitos campeões dessa moda ainda estão vivos e exibem mocidade(1939).
 Todavia, nenhuma dessas crônicas terá talvez o sabor da que apareceu no jornal do Rio, “A Notícia”, de 12 de Abril de 1898. Vamos apreciá-la:
  
 “A Bicicleta invade-nos. A principio apareceu timidamente, como que receosa de revolucionar os nossos costumes pacatos. Além disso, os tradicionais buracos das nossas ruas, que são uma das poucas coisas que conversamos religiosamente, eram como um obstáculo ao desenvolvimento da bicicleta, rainha triunfante, que já tomara conta da Europa, depois de conquistados os súbditos norte-americanos e que agora se propunha atravessar esta parte do oceano, viajando elegantemente encaixotada.
 Mas, como todo o estrangeiro recentemente desembarcado, a quem a febre amarela apavora, a bicicleta subiu para Petrópolis, e ai encontrando  terreno mais favorável, não tardou a tomar conta dos veranistas. Restava-lhes porém, a conquista do belo sexo, sempre mais rebeldes a estas inovações, por causa das “boas línguas” das amigas. Essa conquista está agora feita: as senhoras da nossa sociedade, elegante entregam-se agora ardentemente a este gênero de esporte, com grande júbilo das costureiras que assim tem mais um pretexto para ganhar dinheiro, pois a bicicleta exige um vestuário “sui-generis”*.
 A conseqüência de função bicicletistas era que, mais dia menos dia, teríamos em Petrópolis uma festa de que fosse a rainha a Sra. Bicicleta. Essa festa realizou-se ontem, e com um êxito tal, que não será para admirar que dentro em pouco tenhamos a sua repetição.
 Infelizmente o belo sexo absteve-se de tomar parte ativa; mas esperamos que da próxima vez ele não hesite em trazer o seu precioso concurso, dando assim mais interesse, ainda ás corridas”.

 Feita esta ligeira digressão... histórica tem a palavra o modesto repórter que passa dar, sem frases, o resultado dos cinco páreos, na ordem em que foram corridos, transformando assim a ordem das fatores, e com “gaucherie”de quem faz uma coisa que não está acostumado e que o encarregaram por acaso.

 “O 3º páreo ( 3 voltas, 600 metros) foi ganho pelo jovem Henrique Raul Chaves que recebeu muitas palmas, chegando em 2º lugar o Sr. Frederico Teixeira Soares e em 3 lugar o Sr. João Teixeira Soares. Caiu o Sr. Alfredo Marques de Sá. Resta-lhe a consolação de não ter sido o único.
  Correu-se depois o 2º páreo, cuja distância era de 1000 metros, e que foi ganho pelo Sr. José Francisco de Barros Pimentel, chegando em 2° lugar o Sr. Otávio Guinle e em 3° o Sr. Waldemar da Cunha e Souza. Caiu o Sr. Edgard Bastos.
 No páreo das meninas (300 metros) tomaram parte apenas senhoritas ( o termo está consagrado) Flavita Leão Veloso e Laurita Teixeira Soares, chegando esta em 1° lugar, mas com pouca diferença.
 O páreo mais longo foi o primeiro cuja distancia era de 3000 metros (15 voltas) e que foi disputado pelos Srs. Eurico Godoy e Raul Barbosa, chegando aquele em 1º lugar. Via-se porém que a força de ambos era igual.
 No quarto páreo (1.000 metros) foi vencedor o Sr. Arnaldo Guinle, chegando em 2° lugar o Sr. Pedro Luiz Osório, que caiu, mas depois continuou a corrida. O mesmo aconteceu com o jovem Edmundo Leuzinger, que esse não pode continuar.
 Terminada as corridas, que se seguiram sem grande intervalo e foram acompanhadas com interesse pelos entendidos e pelos profanos, em cujo número nos alistamos, uma gentil comissão de senhoritas fez a distribuição dos prêmios vencedores e de bronze aos segundos e bibelots as menina, distribuição que correu entre palmas.
 Depois, o Sr. Araújo Maia fez o elogio da bicicleta e levantou um viva ao presidente do Estado, que se achava presente e que acompanhou a festa com muito interesse.
 Depois... depois dançou-se com muita animação, como se na véspera não se tivesse dançado, no Cassino, em um baile animadíssimo e que terminara ás 2 horas da manhã por um “cotillon” magistralmente conduzido pela Exma. Senhorita Regina Amoroso Lima e o Sr. João Vianna, cuja competência no assunto é muito conhecida.
 Ambas as festas estiveram brilhantes e “réussies”*. A de ontem foi favorecida por um belo tempo, embora quente; mas o calor não arrefeceu a animação dos graciosos pares.
 Como se vê, Petrópolis, “s’amuse”, e faz muito bem, porque lá diz a sabedoria das nações: quem se diverte seus males espantas. Isto é, a sabedoria das nações diz: que canta... mais, no fim, dá certo.”

* Sui-generis = Forma única de ser, singularidade
* Réussies = Bem sucedido


Retirado do Volume III dos Trabalhos da Comissão do Centenário, 1939.


Gazeta de Petrópolis, 6 de Janeiro de 1894

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