Alcindo Sodré
Não se dispunha, pelo título destas notas que vamos tratar
das relações do nosso primeiro imperador e a povoação de Petrópolis, e muito
menos do projeto de José Bonifácio apresentado à Constituinte de 1823 lembrando
a conveniência da metrópole imperial ser edificada no coração do país, e
poderia ter o nome de “Petropole”, em homenagem ao autor da independência.
Vamos cuidar de Pedro I com Petrópolis ainda Rio Seco e Córrego Seco, conforme
as denominações da época, Petrópolis que haveria de ser em consagração ao
filho, já que não pôde ter sido ao pai.
Charles Ribeyrolles,
das perguntas que fez ao velho tropeiro do alto da serra, José Antonio Furtado,
obteve entre outras a seguinte resposta: “Era um grande caçador e um guapo
caminheiro o sr. D. Pedro I; ele acabou a estrada velha, que conduz da Raiz da
Serra até o Alto, e que seu pai D. João VI tinha aberto; mas não é que ele
tinha o pé afeito ás montanhas o imperador, e não lhe metiam medo as picadas.
Não era um verdadeiro tropeiro ele, pois que era imperador, mas era um gosto
vê-lo se meter nas florestas a dentro. Ele aqui vinha muitas vezes ano, nos
matos perdido, com diziam na cidade, e ia visitar o seu amigo o padre Corrêa,
que tinha uma fazenda mais além, mesmo no lugar de muda de vossas diligencias,
entre Petrópolis e Pedro do Rio. Ora um dia que voltando com a segunda
imperatriz, parara em Córrego Seco, disse-lhe ela que o ar era bom e o lugar
belíssimo D. Pedro, que tinha a mão ao pé da língua, disse duas palavras a José
Maria, o Major, deu-lhe 20 contos de reis e ficou-se com a fazenda; era um
capricho e um bom negócio.
O folhetinista da “Gazeta de Petrópolis” de 1883 escrevendo
sobre a “Origem, fundação e desenvolvimento da colônia de Petrópolis.”
Adiantou: “ Na sua ida para a residência do padre Corrêa, a 4 de Dezembro de
1829, ao chegar ao alto da serra da Estrela, mui cansado, após penosa subida
por péssimo caminho e tendo com a maior satisfação apreciado o magnífico
panorama que dali se descortina, manifestou D. Pedro desejo de construir um
palácio nesse lugar e para isso comprou um terreno a Antonio Correa Maia por
2:400$00.”
Raffard, por seu turno, adianta: “No dizer de outro
informante o sr. D. Pedro I tornou a ver o Córrego Seco em 29 de Dezembro de
1829, quando levava para a fazenda dos Corrêas, uns 13 quilômetros mais para o
interior, a Família Imperial, por ter sido ordenada uma mudança de ares á
Princesa D. Paula.”
J. Tinoco, em seu “Guia de Viagem”, refere-se à viagem que a
25 de março de 1822 fez da Corte a Minas Gerais o imperador Pedro I, o qual,
quando chegou ao Alto da Serra, não só pode restaura-se das fadigas, de uma
jornada apreciar um panorama que lhe sugeriu a ideia de construir um palácio
naquele belíssimo lugar. E referindo-se também a enfermidade da princesa D.
Paula, fala na viagem imperial de 4 de Dezembro de 1829.
C.S. Sterwart, em sua obra editada em 1895, “Brazil and La Plata”, diz que Pedro I
teve a intenção de colonizar com alemães a fazenda do Córrego Seco, mas sua
abdicação impediu o fato.
Não encontramos nenhum elemento para confirmar esse projeto
de D. Pedro I, que nos parece ser fruto de possível confusão do autor. As de
declarações dos demais referidos publicistas, são, pelo menos, verossímeis. Que
Pedro I viesse várias vezes ao Córrego Seco é ideia perfeitamente aceitável
dado o seu temperamento aventureiro e a sua natureza física. O desejo de
adquirir terreno para construir palacete é natural, e conseqüentemente dos
passeios que por ai dava. A aquisição de um, por 2:400$000 a Antonio Corrêa Maia,
é circunstancia de que ainda não achamos provas. A viagem a Corrêas em 1829,
por conta da moléstia de uma filha e a resultante compra do Córrego Seco não
padece dúvida.
Houve, entretanto, duas passagens de Pedro I pelo Córrego
Seco que não foram descritas pelos cronistas de Petrópolis, e no entanto tem
elas grande valor histórico nacional, sem desprezar-se a repercussão local, que
foi digna de nota. Foram as ocorridas em 26 de Março de 1822 e a 30 de Dezembro
de 1830.
A primeira, como vimos, foi registrada por Tinoco e Raffard,
erradamente, diz que ela se efetuou em Março de 1825.
A 26 de março de 1822 Pedro I passa a primeira vez, pelo
Córrego Seco, ainda como príncipe regente, a caminho de Vila Rica em missão
política de relevância. Pernoitou na fazenda da Cordoaria, Raiz da Serra, e a
noite seguinte passou na fazenda dos Corrêas. Entre os acontecimentos do 1822
que tiveram decisiva repercussão no 7 de Setembro, destaca-se a ida do príncipe
D. Pedro I a Minas Gerias.
“Com essa viagem, diz Varnhagem, havia-se operado no animo do
príncipe uma transformação radical. Encerrando que vivia entre as montanhas do
Rio de Janeiro, absorto contemplava o príncipe, em Minas Gerais, a grandeza e a
vastidão do Império virgem que a Providência lhe reservava, nesses panoramas
que se sucediam a seus olhos.”
Recebido com festa em São João Del Rei e Queluz, teve a
ventura de submeter a Junta de Villa Rica, reconhecendo assim Minas Gerais a
legalidade da sua regência e aplaudindo os seus projetos de liberdade e
constituição.
Nessa viagem, ele foi acompanhado do desembargador Estevam
Ribeiro de Rezende, mais tarde, Marquês de Valença; de Teixeira de
Vasconcellos, ouvidor de Sabará, vindo a ser Visconde de Caeté; de José de
Rezende e o padre Belchior Pinheiro,
deputados da Corte e o último, sobrinho de José Bonifácio, do guarda-roupa
Berquó, mais tarde, Marquês de Cantagalo; um criado particular, um moço de
estrebaria e 3 soldados. A frente da comitiva, adiantados, iam dos cargueiros
com roupas, guiados por um sargento.
O príncipe não quis levar cozinheiro, nem regular suas
paradas: comeria que o encontrasse pelo caminho e dormiria em esteiras se fosse
necessário.
Em 30 de Dezembro de 1830, D. Pedro I, a Imperatriz Amélia e
sua comitiva passaram pelo Córrego Seco seguindo para Minas Gerais, onde os
levavam fatos já ligados ao futuro sucesso de 7 de Abril. Partiram para essa
viagem a véspera, do cais de São Cristovão às 8 horas da manhã, para o porto da
Estrela.
Acompanharam nessa viagem às Minas, as seguintes pessoas: o
ministro do Império Silva Maia; a Baroneza de Stcomfeder; camarista Luiz Pinto
Guedes; veador da Imperatriz Lázaro José Guedes; Francisco Dietz; Maria Stab;
Tremisson; Nani; José Maria Lobo, resposteiro; dr. Tavares; capelão-cônego
Camélio e mais 5 criados particulares; a uxaria e mantearia.
Chegaram à Fábrica de Pólvora às 3:20h da tarde e às 6 horas
da manhã do dia 30 partiram para a fazenda dos Corrêas, onde chegaram às
11:20h, depois de uma jornada penosa devido ao mau tempo e o estado do caminho.
Partindo de Corrêas depois das 7 horas da manhã de 1° de Janeiro às 11:45h,
chegaram à fazenda do Secretário.
Em Corrêas e por intermédio do ministro do Império. Pedro I
toma uma providência administrativa de caráter local, por certo a primeira do
gênero, relativa às paragens da futura Petrópolis.
"Attendendo ao
incalculável prejuízo que, com perdas de fazendas e perigo de vida resulta da
falta da ponte que houvera sobre o rio Morto da fazenda do Corrêa e estradas de
Minas Gerais, e a urgentíssima necessidade de se construir outra para facilitar
e segurar o transito das muitas tropas e viandantes que giram desta para
aquella da Villa de S. Pedro de Cantagallo, que sem perda de tempo dê todas
providências, que são de suas attribuições, sobre a referida ponte, procedendo
immediatamente as diligencias ordenadas pelo seo regimento e pela Lei de 20 de
Agosto de 1828; e dando parte de tudo o que se fizer, e das dúvidas e
obstáculos que se lhe offerecem pela secretaria de estado dos negócios do
Império.
Fazenda do Corrêa, 30 de Dezembro de 1830.
José Antonio da Silva Maia.”
Da viagem de 1822, vimos que um dos membros da comitiva de
Pedro I foi o desembargador Estevam Ribeiro de Rezende, mais tarde Marquês de
Valença. Esse titular, em 9 de Julho de 1850, viria a ser foreiro em Petrópolis,
obtendo 1.198 braças quadradas, desmembradas do prazo 2.201, pertencente a
Honório Hermeto Carneiro Leão, Marquês de Paraná, grande do Império, que foi o
registro n° 1 dos foreiros de Petrópolis, que pagava por este prazo 5$450 desde
de 1 de Janeiro de 1846, registrado pelo escrivão Ribeiro Cirne e assinado por
Koeler, José Luiz de Azeredo Coutinho e João Gustavo de Frontin. Situado no
Palatinado Inferior, fazia frente para a Rua do Honório e fundo para a Rua do
Imperador e lado para o rio do Córrego Seco. Além da parte desmembrada para o
Marquês de Valença, houve outra de trinta braças para Henrique Carpernter e o
restante em 27 de Maio de 1882 a 25 de Abril de 1884 passou respectivamente à Companhia Estrada de Ferro
Príncipe do Grão Pará e a Christiano Benedcito Ottoni.
Fonte:
Trabalhos da
Comissão do Centenário – Vol II –1939.
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