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A MATRIZ VELHA -
João de Petrópolis pseudônimo de Walter João Bretz.
Publicado na Tribuna de Petrópolis em 25 de Maio de 1926.
Brevemente dir-se-á a ex - Matriz-Velha, pois terá desaparecido o venerado templo católico, o primeiro dos que existem nesta cidade.
As obras da sua demolição iniciaram-se a 9 de
Março ultimo e, a 27 de Abril deste ano, o leiloeiro Augusto Pinto de Carvalho
vendeu, ao correr do martelo, os materiais de construção aproveitados da
veterana igreja.
Com grande pesar, os velhos e incorrigíveis
cultuadores das tradições da cidade assistiram a esse cena, que aliás, não pode
efetuar-se na data originalmente fixada, 23 de Abril, por haver chovido,
ficando assim transferida a praça.
Parece mesmo que a própria natureza não quis
conforma-se com a resolução dos homens a serviço do progresso; e, derramando as
duas lágrimas, em forma de chuva, adiou por mais algumas horas a dispersão dos
materiais da velha Matriz pelos quatro pontos da cidade serrana.
Apenas para fixar a data do desaparecimento da
mais antiga das igrejas locais, resolvi escrever este apanhado de notas que
relembrará alguns fatos ligados à história local.
Digo propositalmente a mais antiga igreja
“desta cidade” visto que, na área que, primitivamente, formava o nosso
município, houve uma outra capela bem mais velha. Existia esse templo no lugar
denominado “Rio da Cidade”, no 2° distrito municipal; e, construída por Manuel
Antunes Goulão, sob a invocação de “Nossa Senhora do Amor de Deus”, foi benzida
em 29 de Outubro de 1751, tendo tido a faculdade de usar a pia batismal em
favor dos moradores do lugar.
A provisão para a respectiva construção fora
concedida em 29 de Outubro de 1749, ao referido Goulão, a quem haviam sido
dadas em sesmarias as terras correspondentes, deste a fazenda do Itamarati até
Pedro do Rio.
Voltando, porém, ao assunto desta crônica,
direi que o território da primitiva colônia de Petrópolis, formava um curato
que foi desmembrado da freguesia de São José do Rio Preto, município da Paraíba
do Sul, passando para a Vila da Estrela pela lei n. 397 de 20 de Maio de 1846,
que elevou o mesmo curato à categoria de freguesia, sob a invocação de “São
Pedro de Alcântara de Petrópolis”. Isto há, pois, oitenta anos, na data de
hoje.
Os primeiros atos da novel paróquia foram
celebrados em dependências do próprio provincial, que existiu outrora entre as
ruas D. Januária e D. Francisca, no local onde está presentemente o fórum.
(Atualmente prédio do CEFET, na Rua do Imperador).
Este edifício era de construção térrea e
abrangia o espaço compreendido entre o atual prédio do Banco Construtor do
Brasil e a esquina da Rua General Osório.
Ficavam nele instalados o quartel do
destacamento policial, com um largo portão, onde se guardavam a bomba de
incêndio; a cadeia pública, cujas grades davam para a rua do Imperador, de modo
que os presos podiam ser vistos e conversar com os transeuntes; a delegacia e subdelegacia
de policia; o depósito das obras públicas, e, finalmente as dependências comumente
ocupadas por uma das escolas públicas da Província do Estado. Em carias épocas
estiveram, também localizadas na vetusta edificação, a agência dos correios, a
casa de Caridade, o Liceu de Artes e Ofícios e diversas repartições publicas.
Oficialmente chamavam aquilo os “os quartéis da colônia”, mas o povo aplicava
ao conjunto o nome de “ a nação” por ser uma propriedade do governo.
Nessa casa, que, no correr dos anos, foi
tendo, como vimos acima, as mais variadas aplicações, ficou nos primitivos
tempos da Colônia, preparada uma sala, na qual todos os domingos o pároco
rezava o santo ofício da Missa e, no mesmo local, em outro dia da semana ou em
hora diferente, o pastor protestante também celebrava o seu culto divino.
Essa fase da vida petropolitana teve os seus
aspectos bem interessantes, tanto que o mordomo do Palácio Imperial,
conselheiro Paulo Barbosa quis erigir uma igreja comum a todos os cultos
cristãos, a exemplo do que se praticava na Alemanha, onde os reformados
permitiam aos fieis de outras crenças, inclusive os romanos, a utilização de
seus templos.
Dizem que este projeto não prevaleceu ante os
obstáculos que lhe opôs o internuncio apostólico, monsenhor Fabrini, apoiado
pela intransigência da camareira-mor do paço imperial.
Em todo o caso, reinava entre os colonos, a
mordomia do palácio e a diretoria da Colônia um pronunciado espírito de
concórdia que tornava possível cogitar de matéria aparentemente tão melindrosa
de encarar.
Na Matriz provisória realizavam-se com
relativa imponência os atos eclesiásticos, notadamente a festa do padroeiro da
freguesia e os grandes dias da religião.
Ali, exerceu o seu ministério vicarial o
cônego Luiz Gonçalves Dias Côrrea, que foi o primeiro pároco da freguesia de
Petrópolis e, sob cuja direção espiritual já se achava a localidade, mesmo como
simples curato.
Era, entretanto, impossível que continuassem
em tão precária instalação os serviços divinos da Colônia, tendo especialmente
em vista que os alemães insistiam pela prometida assistência religiosa , a par
das escolas, de que não queriam prescindir
na sua nova pátria e da qual, segundo os três pedidos feitos ao
conselheiro Aureliano Coutinho, presidente da Província, também desejavam ser
considerados cidadãos.
O major Julio Frederico Koeler, diretor da
Colônia, desde logo incluíra nos planos da construção da cidade o levantamento
de uma igreja matriz condigna, tendo sido deseigando para esse fim o terreno
cedido pelo imperador D. Pedro II, desde 1845, no “Morro do Belvedere”. Por
esse nome designava-se o logradouro público que, por deliberação do Conselho de
Intendência Municipal, passou a denominar-se, em 25 de Julho de 1891, a “Praça
São Pedro de Alcântara”, muito embora o povo preferisse sempre chama-lo o
“Morro da Igreja”.
Toda a gente previra, entretant, desde logo,
que do projeto à realização da ideia muito teríamos de caminhar e que a sua
execução dilatar-se-ia pelos tempos afora. Os fatos vieram confirmar o prognostico
dos nossos antepassados, pois somente oitenta anos à fundação da cidade e
cinqüenta depois do lançamento da primeira pedra fundamental da Nova Matriz é
que esta passou a ser a sede da paróquia, muito embora ainda estejam longe de
sua conclusão as obras respectivas.
Antevendo uma grande demora na edificação do
templo planejado, os fundadores de Petrópolis preferiram adotar uma solução
praticamente mais viável e de alcance imediato para o bom andamento da vida
religiosa do lugar. Essa solução estava em dotar a Colônia, mesmo
provisoriamente, com um templo mais modesto, uma simples capela, por exemplo.
Daí surgiu a ideia de adaptar-se
convenientemente, para o fim desejado, o barracão existente à rua da Imperatriz
e cujo destino fora originalmente o agasalhamento e recebimento dos colonos
alemães, antes da respectiva instalação nos diversos quarteirões.
Aceito esse alvitre pelo imperador D. Pedro II
e pela administração provincial, o major Koeler encarregou o empreiteiro de
obras, Justino de Faria Peixoto, de construir a Matriz velha.
O mestre Justino, que residia à rua do
Imperador, numa casa onde durante muitos anos morou depois o finado tabelião
João Cordeiro do Carvalho (na Rua do Imperador), deu inicio às obras a igreja
de 1847 e concluiu-as em 1848, passando, nesse mesmo ano a funcionar no templo
que ora está em demolição, a paróquia de São Pedro de Alcântara.
Por mais de setenta e sete anos, pois, a
palavra divina ecoou naqueles vestustas arcadas, sob as quais gerações seguidas
de católicos petropolitanos receberam os sacramentos da Igreja e os
ensinamentos de seu credo.
A Matriz Velha está bem enraizada no coração
do povo e as suas tradições que são, em boa parte, as da própria cidade, permanecerão
perpetuamente na memória dos nossos conterrâneos.
Muitos dos mais idosos que ali foram batizados
e casados e também, naquele recinto assistiram ao batismo, à comunhão, à crisma
e ao casamento de filhos, netos e bisnetos, por isso mesmo, não se conformam
com o desaparecimento daquele tabernaculo das suas mais gratas recordações.
Sob as inspirações divinas, quantas venturas
não foram ali argamassadas com as bênçãos celestiais; e quantas róseas
esperanças carinhosamente cultivadas, naquele sitio não se terão esboroado há
inconstância das coisas humanas?
Tudo o que a família católica de Petrópolis
construiu nestas quase oito décadas terá de procurar os seus alicerces na
Matriz Velha, que, por poucos dias, ainda existirá na mudez de quatro paredes,
expostas ao tempo e à próxima destruição do alvião inclemente do progresso.
Tudo isto, porém, não são palavras vãs, que o
vento leva, como hão de ser consumidos os últimos vestígios da igreja dos
nossos antepassados, afim de que se cumpra, em toda a plenitude a sentença
irrecorrível: “Pulvis es et in pulverem
reverteris”.
Data de 1848, o primeiro sino inaugurado na
Matriz, sino este que ainda existe e está atualmente na Catedral.
Esse sino, no qual está fundida uma imagem do
Anjo da Guarda, serve para tocar as “Ave-Marias”.
Chamava-se, por esse motivo, o sino do
“Angelus”, segundo me informa pessoa conhecedora do assunto.
No regime da religião oficial, as obras da
Capela-Matriz estiveram sempre aos cuidados da Superintendência da Fazenda
Imperial e da província do Rio de Janeiro.
Aquela, por exemplo, instalou, em 1854, a
grade e a cancela de balaustras, torneados na linha divisória da igreja, com a
capela-mor. Essa grade, ao que se diz, é a que existiu até ultimamente; e,
apesar de sua simplicidade material, encerra um relevante valor histórico, pois
foi junto dela que os fieis petropolitanos, a começar pela família imperial,
receberam, aos milhares, o sacramento da Eucaristia.
Por isso mesmo, o conhecido construtor de
obras sr. Heitor Levy, que está demolindo a igreja, nem gesto muito piedoso,
retirou da alçada do leiloeiro, essa e outras peças, igualmente respeitáveis do
templo.
Lemos numa obra sobre Petrópolis, que, em
1865, a Matriz fora reedificada e decentemente arranjada, gastando-se nessas
obras a soma de 12:000$, cuja metade foi fornecida por uma subscrição promovida
entre os petropolitanos e os seus hospedes, e a outra metade pela administração
provincial.
“Aliás”, diz a mesma obra, “essa capela é
somente provisória, devendo edificar-se matriz condizente com o número de fiéis
e importância a cidade, na eminência já indicada ( o morro do Belvedere),
servindo depois a capela para templo do culto reformado, cujos sectários até
hoje não tem podido celebrar os seus ofícios senão em sala particular alugadas
para esse fim.”
Von Tschudi, em sua obra “Reisen durck
Sudamerika”, dizia em 1866, referindo-se
à Matriz de Petrópolis, “que ela mal ultrapassava das dimensões de uma
capela, sendo mesmo designada pelo título de Capela de São Pedro de Alcântara”.
É de uma simplicidade primitiva e
demasiada pequena para as necessidades de Petrópolis.
A construção de uma Matriz na entrada da rua
Joinville, no quarteirão Francês, aliás, já está há algum tempo projetada, mas
terá de aguardar, por tempos, a sua execução. No caso de realmente ser
construída a igreja, deverá a atual capela ser destinada para o serviço divino
protestante, que agora é celebrado na escola em ruína.”
O coro, como ultimamente se achava, a julgar
por uma inscrição existente nos respectivos barrotes, assinalando o dia 28 de
Setembro de 1876, deve ter sido reformado naquele ano.
Em 1895, começou, no dia 31 de Janeiro, a
construção da torre, que se ergue ao lado esquerdo do templo. Naquela época foi
também construído nos fundo da igreja o consistório novo e instalado o grande
sino de “S. José”, isto durante a provedoria do capitão José Lopes de Castro.
A construção da torre ficou assinalada por um
desastre, tendo dela despencado para a rua o sr. Brandão, que fazia parte da
administração da Irmandade.
Em 1898, durante o vicariato do padre Valença,
a Matriz passou por uma geral reforma, tendo sido modificado, em parte, o
interior, pintada a parte interna e ampliada as dependências do templo.
Nessa ocasião foram executadas, por um artista
italiano, as telas do teto, representando os dozes apóstolos e das quais ainda
existem nove: as de S. Tomé, Simon, João, Bartolomeu, Felipe, Jacob I, André,
Mateus e Jacob II, faltando as de S. Pedro, S. Paulo e S. Marcos, que a ação do
tempo prejudicou.
Foram então construídos os quatro nichos
laterais, nos quais ultimamente era cultuadas as imagens de Nossa Senhora das
Dores, a mais antiga das existentes; e Santo Antonio,à direita do alta-mor; e
Nossa Senhora da Conceição e São Benedito, à esquerda.
Na capela-mor, presidia ao altar principal a
imagem de São Pedro de Alcântara, como padroeiro da freguesia, que tinha, ao
lado direito, São Geraldo e o Sagrado Coração de Jesus, este num nicho; e à
esquerda, São Sebastião e Nossa Senhora da Soledade, ficando esta também num
nicho.
No seu “Dicionário Geográfico”, Moreira Pinto
referia-se às imagens da Matriz, dizendo que ali existiam três altares, isto
antes da reforma do padre Valença: São Pedro de Alcântara, São José e Nossa
Senhora das Dores.
No de São José, lia-se a inscrição: “Ite ad Joseph et quid ipse vobis dixerit,
facite”, e na de Nossa Senhora: “Nobis
lutem conferant Dei parae tot lacrimae.”
Do lado exterior da Matriz em dois nichos,
existiram primitivamente duas estátuas de gesso dos apóstolos São Pedro e São
Paulo, substituídas mais tarde por duas outras, a do Coração de Jesus e de
Nossa Senhora de Lourdes.
Essas imagens, como as demais da igreja, estão
sendo ao que ouvimos, distribuídas por outros templos, visto terem de obedecer
ao estilo próprio da nova Matriz as que ali forem sendo colocadas.
Depois da reforma executada pelo padre
Valença, em 1898, somente uma outra obra de conservação terá sido feito no
velho templo, o que aliás, se justificava pela iminência em que se encontrava
sempre a paróquia de ser, de uma para outra hora, instalada na sua nova sede, o
que, logicamente, não aconselhava despesas supérfluas e dispensáveis.
Em 19 de Outubro de 1899, inaugurou-se a nova
capela do Santíssimo Sacramento, construída aos fundos e à direita da igreja.
Essa dependência, aliás, pouca utilização
parece ter tido, havendo ultimamente estado ali instaladas durantes alguns
tempo as oficinas do “Centro da Boa Imprensa”, antes da sua mudança para a
antiga “Casa dos Semanários”, do Palácio Imperial, à atual rua Dr. Joaquim
Moreira.
Subentenda-se, ao ler estas linhas, que
estamos publicando apenas apontamentos esparsos sobre a tradicional igreja,
mesmo porque referir-lhe a crônica detalhadamente seria reproduzir a historia
da cidade, em boa parte.
Depois do vicariato do cônego Corrêa, que
pastoreou o rebanho petropolitano de 1846 a 1854, foram párocos na velha Matriz
os seguintes sacerdotes:
Padre Antonio José de Melo, de Janeiro até
Dezembro de 1855
Padre
João Higino de Carmago Lessa, de 1856 e 1857
Padre
José Domingues Nogueira da Silva, de 1857 até Junho de 1858.
Padre
Nicolau Germain, de Junho de 1858 até Julho de 1878, substituído apenas, em
1869, durante uma viagem à França, pelo padre Dr. Pedro Peixoto de Abreu Lima,
que ficou como pro-pároco.
Padre Teodoro Esch, de Julho de 1878 até 1890,
tendo sido substituído, em 1889, enquanto viajava na Alemanha, pelo padre Vito
Maria Jurno, pro pároco.
Padre Antonio Maria Correa de Sá, de Janeiro
de 1891 a Março de 1896, tendo ficado, em sua ausência como encarregado da
freguesia, por pouco tempo, o padre Tomáz Aristoteles Guizan.
Padre Isidoro Monteiro, de 11 de Março a
Setembro de 1896. Ao que afirmam, este religioso da Congregação da Missão era
petropolitano, e teria sido assim o único dos nossos conterrâneos a quem
coubesse dirigir espiritualmente a paróquia natal.
Monsenhor Agostinho Francisco Benassi, atual
bispo desta diocese (1926), 26 de Setembro de 1896 até Dezembro de 1897.
Monsenhor Dr. Antonio Macedo Costa, de 23 de
Dezembro de 1897 até a nomeação do novo vigário, regeu a freguesia, como
encarregado.
Padre
José Joaquim Valença, de Janeiro de 1898 até Fevereiro de 1901.
Monsenhor Teodoro da Silva Rocha, de 2 de
fevereiro de 1901 até a sua morte, em 22 de Fevereiro de 1925.
Padre Leon Andrieu, coadjutor da freguesia, na
vacância, de 22 de Fevereiro a 21 de Abril de 1925; e, finalmente, o atual
vigário, padre Conrado Jacarandá, que exerce o seu cargo desde 21 de Abril de
1925, tendo sido nomeado a 30 de Março precedente.
Desses vigários, o primeiro, cônego Corrêa, e
o penúltimo, monsenhor Rocha, foram acometidos do mal que os vitimou, quando,
dentro da velha Matriz, exerciam o seu sagrado ministério.
A Agostinho Benassi coube a tarefa de receber
na veterana igreja, alçada à dignidade de Sé Episcopal, o primeiro bispo de
Petrópolis e também a de reinstalar, em Niterói, a sede da diocese fluminense,
daqui removida pela Curia Romana para antiga Praia Grande.
Nos tempos da Colônia, havia também os curas
dos colonos alemães, tanto protestantes, como católicos.
Destes últimos, o primeiro de que há noticias
é o padre Francisco Antonio Weber, a respeito do qual diz Henrique Raffard, no seu
“Jubileu de Petrópolis”, ter vindo na companhia dos colonos.
Neste ponto, o erudito historiógrafo deve ter
sido guiado por alguma informação errônea, pois não consta que os colonos de
1845 trouxessem o seu guia espiritual.
O padre Weber terá sido contratado
posteriormente, tanto que constam atos seus datados de 1847, sendo alguns
batizados em que serviram de ex-padrinho os imperantes.
O primeiro deles é consignado pelo seguinte
assentamento:
“Anno Domini millesimo
octingentésimo quadragésimo septimo, die vigésima octava, memsis Octobris, ego,
Franciscus Antonius Weber, parochus hujus ecclesiae sancti Petri ab Alcanthara,
civitatis Petropolis, baptizavis infantem, natum die vigésima, mensis Augusti,
ex Nicolao Dietrich et Catharina, conjugibus hujus Parchia, cui impositum est
Nomen Pietrus. Patrinus fuit: Serenissimus et potentissimus Princeps Dominus –
Dominus Petrus Secundus, Imperator Brasiliae semper Augustus. Matrina fui:
Serenissima et potentíssima Princeps Domina D. Theresia Christina Maria, Imperatrix
Brasiliae, semper Augusta. D. Pedro 2º - Thereza.”
Tradução para o português atual*:
“No ano 1847 dc no 28º dia do mês de outubro, eu Francis
Anthony Weber, pastor da igreja de São Pedro de Alcântara, cidade de
Petrópolis, batizou o bebê, nascido no dia 23 de agosto
Nesse tempo, a freguesia ainda funcionava nos
“quartéis da Província”, onde estava, provisoriamente, instalada, como já vimos
acima.
Ao padre Weber sucederam curas interinos dos
colonos, entre os quais o coadjutor da freguesia padre Nicolau Gemain, aliás,
de nacionalidade francesa e que, nem por isso, se entendia menos bem com as
suas ovelhas teutônicas.
Por provisão episcopal de 10 de Janeiro de
1845, porém foi nomeado curo dos colonos alemães o padre dessa nacionalidade
Teodoro Wiedemann, que, apresentando ao Diretor da Colônia um título provisório
de 9 do mesmo mês, desde logo foi empossado, deixando as funções o “abbé”
Germain, que as exercia interinamente.
O padre Wiedemann pouco tempo se manteve em
paz no seu posto, pois, querendo exercer uma autoridade paralela à do vigário
da freguesia, de quem, todavia era subordinado, criou uma situação grave na
Colônia.
Essa questão chegou ao auge no dia 25 de Março
de 1855, quando os colonos, como de costume, faziam uma coleta para o cura,
durante a missa. O diretor da Colônia, tenente-coronel Alexandre Manuel Albino
de Carvalho, achando que isso não devia ser permitido, foi à Matriz e proibiu
que a coleta se efetuasse. Daí resultou um atrito entre o cura e o diretor da
Colônia, tomando os colonos o partido do padre Wierdemann, a ponto de
pronunciarem, em alemão, palavras insultuosas ao coronel Albino, o que deu
lugar à prisão dos mais exaltados.
Os demais colonos rebelaram-se também e
tornou-se preciso reforçar a guarda da cadeia, com paisanos armados, tendo o
presidente da Província, Luiz Antonio Barbosa, ordenado ao chefe de polícia vir
tomar conhecimento do ocorrido e providenciar convenientemente.
No mesmo oficio em que isso comunicava ao
diretor da Colônia, dizia a autoridade suprema da Província:
“Recomendo-lhe, entretanto, que procure evitar
por parte das autoridades qualquer provocação, como o foi a prisão de que se
trata por ser contraria à disposição das leis, visto não se acharem os
indivíduos que a sofreram em alguns dos casos em que as leis autorizam a prisão
sem culpa formada.”
O diretor da Colônia acusava o cura Wiedemann
de ter a pretensão de exercer o seu emprego como prefeito e independente pároco
e não como simples cura de almas, que era ou deveria ser, ou antes como
verdadeiro coadjutor do pároco da freguesia; e, nessas conformidades, o mesmo
Wiedemann vivia até em divergências com o vigário Melo e o padre Germain, coadjutor
deste.
O resultado final foi a exoneração do cura por
deliberação do governo provincial e provisão do bispo, de 16 e 18 de Abril 1855, atos que o sucessor do coronel Albino
achou “haverem sido uma barreira às sugestões que entre os colonos católicos promoveu
o padre Wiedemann, amotinado a população alemã, ao ponto de apresentar-se com
caráter hostil e de rebelião pelas insidiosas idéias de independência do seu
ministério, que o padre, com tempo e habilidade, foi infiltrando nas famílias
dos colonos, sob os auspícios da religião.”
O presidente da Província, ao comunicar ao
diretor da Colônia a exoneração do padre Wiedermann, esperava “alguma
demonstração imprudente por parte dos alemães, que o cura pudesse ter
fanatizado.”
Tudo acabou, porém, sem maiores dissabores; o
coronel Albino que, por várias vezes pedira exoneração do seu cargo, por motivo
de moléstia, aproveitou o ensejo para reiterá-la, sendo-lhe também concedia.
E assim terminou a crise que tivera tão forte
repercussão na Matriz Velha.
Voltou a cura dos alemães ao padre Germain, e,
como este não falasse o alemão, passou a vir, de vez em quando a Petrópolis o
padre Carlos Winckler, capelão do Asilo de Santa Leopoldina, para o serviço
religioso dos seus patrícios aqui instalados.
Em 31 de Dezembro de 1853, criou-se a
Irmandade do Santíssimo Sacramento de S. Pedro de Alcântara, cujo primeiro
provedor eleito foi o diretor da Colônia, coronel Alexandre Manuel Albino de
Carvalho, realizando a instalação provisória da mesa a 28 e Novembro de 1854, com
a seguinte mesa: Alexandre Manuel Albino de Carvalho, provedor; João Henrique
Lagos, Secretário; Joviano Varela, tesoureiro; Henrique Kopke, procurador; José
Maria Jacinto Rabelo, Tomás José da Porciúncula, Inácio J. Nogueira da Gama,
Maximiniano J. Gudehus, Antonio Luis Machado, Antonio José dos Santos Rocha,
Ricardo Narciso da Fonseca e Camilo Dagofredo, Irmãos de mesa.
O secretário foi, porém, logo substituído por
Antonio Santos Rocha; o procurador, por José Antonio de Carvalho, passando Dr.
Henrique Kopke para irmão da mesa, no lugar de Santos Rocha.
Os fatos supervenientes à exoneração do
aludido diretor, ocasionaram um pequeno retardamento na vida da irmandade, que,
porém, em 102 de agosto de 1855, se instalava definitivamente com a mesa da
qual faziam parte os seguintes irmãos: Barão da Lorena, provedor; Joviano
Varela, secretário; Pedro José Câmara, tesoureiro; Ricardo Narciso da Fonseca,
procurador; Inácio José da Silva, José Gaspar da Cunha Freitas, José Martins
Correia, Antonio Tavares Bastos, Julio Pedro Piot, Joaquim Martins Correia,
José Pinto da Cunha Fernandes e José Antonio de Carvalho.
A
Irmandade do Santíssimo Sacramente, daí por diante, sempre contribuiu para imponência
do culto na Matriz Velha e auxiliou a obra dos párocos com dedicação e
acentuado espírito religioso.
A
Matriz Velha, em 21 de abril de 1864, serviu para sagração de D. Antonio Macedo
Costa, 10° bispo do Pará, sendo sagrante o Internuncio Monsenhor Mariano
Falcinelli Antoniacci, arcebispo titular de Atenas.
Este
fato merece ser assinalado, ao lado de outros passados na Velha Matriz, por
tratar-se de uma das mais notáveis figuras do episcopado brasileiro. D. Macedo
Costa foi com D. Vital, bispo de Olinda, processado por ocasião da questão religiosa
(1873-1875) e condenado a 4 anos de prisão, que começou a cumprir na Ilha das
Cobras, sendo, afinal, perdoado em setembro de 1875.
Ao
tempo do Império, a Matriz recebeu sempre a família imperial sob os seus tetos
e todas as grandes cerimônias da época e da Côrte nela eram celebradas.
Basta
lembrar o solene “Te Deum Laudamus”,
pelo bispo D. Pedro Maria de Lacerda, na tarde de 15 de outubro de 1875, em
homenagem ao feliz nascimento do príncipe de Grão Pará, ocorrido nesta cidade,
naquela manhã.
No
dia 12 de março de 1876, festejando a inauguração do Hospital Santa Tereza e o
lançamento da pedra fundamental da nova Igreja Matriz, também se realizou, com
a presença da família imperial, um “Te Deum”.
Não
menos notável era ali a comemoração do mês de Maria, à qual a Princesa D.
Isabel dedicava todo o seu carinho religioso. Especialmente, em 1888, por
ocasião da Abolição, foi ali entoado por várias vezes o “Te Deum” comemorativo da Lei Áurea, sendo a Redentora,
repetidamente, acompanhada, em triunfo, pelo povo petropolitano até à Matriz e
desta para o paço.
Na
própria data de 13 de maio de 1888, que foi um domingo, a população, recebendo
na estação a Princesa D. Isabel, que chegava da Côrte, onde assinara o decreto áureo,
conduziu-a gloriosamente da gare até a Matriz Velha, fazendo a pé, por não ter
S.A.I. consentido que o povo, no auge do seu entusiasmo pela causa da
Liberdade, desatrelasse os animais do coche imperial para tirá-lo a mão.
Não deve ser olvidada entre as solenidades históricas
comemoradas na Matriz, em demolição o “Te
Deum” com que se celebrou, no dia 17 de junho de 1859, a instalação da
cidade de Petrópolis e a posse da sua primeira Câmara Municipal.
A
Velha Matriz foi ainda o teatro de muitas eleições políticas, que, como se
sabe, eram realizadas no antigo regime nas igrejas. Nem sempre a ordem e o
respeito predominaram nesses pleitos, tendo, por mais de uma vez, havido
conflitos dessa espécie.
Num
barracão armado ao lado da Matriz, servia-se aos votantes o banquete eleitoral,
constante de um grande jantar ou almoço, em que até vezes rezes inteiras eram
retalhadas entre os comensais.
Esses
“comes” regados a “bebes” acabavam, muitas vezes, em sarilho medonhos, dada a
excitação do pessoal...
Na
Matriz Velha recebeu o sr. d. Pedro II, na manhã de 15 de novembro de 1889, ao
ouvir uma missa, as primeiras notícias sobre os acontecimentos do dia,
tendo-lhe, ao que se diz, sido ali entregue o segundo telegrama dos que lhe
passara o Visconde de Ouro Preto, isto é, aquele em que o ilustre presidente do
conselho de ministros solicitava a demissão do gabinete.
O
primeiro dos telegramas ao que dizem, não foi ter às mãos do imperador, apesar
de haver o Visconde de Ouro Preto apurado a sua expedição da Côrte, a sua chegada
à estação tegráfica de Petrópolis e a sua entrega no paço desta cidade...
Da
Matriz, S. M. se recolheu ao palácio, descendo em trem especial afim de seguir,
poucas horas depois, para o exílio.
E
assim escreveu-se uma coincidência histórica. Na Matriz, o Monarca recebeu as
primeiras novas da terminação do seu Império, e, trinta e seis anos mais tarde,
a necessidade de depositar os seus restos mortais, na nova Matriz, apressou a
mudança da paróquia para ali, e conseguintemente, motivou o fechamento do velho
templo.
A
Matriz Velha já foi, como é sabido Sé Episcopal.
Transferida
a diocese fluminense de Campos para Petrópolis, o bispo d. Francisco do Rego
Maia, a 13 de novembro de 1897, entrou solenemente na sua catedral recebido
pelo então vigário Benassi, que, mais tarde bispo, levava, consigo para
Niterói, a cadeira diocesana.
Em
1902, o segundo e ultimo bispo de Petrópolis, d. João Francisco Braga, alçava
as suas armas à entrada da catedral.
Tomou
posse a 30 de outubro de 1902 e com a volta da sede do bispado para a capital
do Estado, a velha igreja de Petrópolis regressou à sua situação antiga de
simples matriz.
Na
Matriz Velha, teve lugar a solenidade da benção da primeira Bandeira da
República, no dia 8 de novembro de 1889.
Essa
festa memorável foi presidida pelo governador do Estado, dr. Francisco Portela,
tendo servido de paraninfos da mesma o
tenente honorário do exército Domingos Manuel Dias, veterano do Paraguai e
presidente da Câmara Municipal; e o dr. Walfrido da Cunha Figueiredo, juiz de
direito da comarca.
Nessa
ocasião deu-se um ligeiro incidente; o Club Republicano, presidido pelo dr.
José Thomaz da Porciúncula, não penetrou no templo e aguardou do lado de fora a
volta da bandeira, a cuja benção, pois,
por uma questão de princípios, os “históricos” petropolitanos não quiseram
assistir.
Foram
memoráveis também na Matriz as cerimônias do mês Mariano celebradas, nos
primeiros anos da República, com o concurso da Escola de Música Santa Cecília,
sob a direção de seu fundador o maestro Paulo Carneiro.
A
figura desse velho amigo de Petrópolis não deve ser jamais olvidada sempre que
houver ensejo de recordá-la. Não esqueçamos pois as tocantes manifestações de
pesar a que, dentro da Velha Matriz, deu lugar à Missa de corpo presente, que
por sua alma ali foi celebrada, em 11 de setembro de 1923.
Correram
também na Velha Matriz, em 1913, os proclamas de casamento do único presidente
da República, que se consorciou no Brasil: os do saudoso Marechal Hermes da
Fonseca com a ilustre sra. d. Nair de Teffé Hermes da Fonseca.
Como
se sabe, o enlace nupcial desse nobre casal teve lugar em Petrópolis a 8 de
dezembro daquele ano, no Palácio Rio Negro.
E
assim, por diante, poderíamos evocar às centenas, as recordações mais gratas e
as mais tristes também, relembrando o que de afetivo se tem desenrolado na
Capela dos primitivos petropolitanos.
Na
tarde de 19 de novembro de 1925, ao verem trasladar-se daquele prédio simples e
vetusto, mas venerável, as relíquias sacras para serem instaladas na suntuosa
catedral de Petrópolis, não puderam, por tudo isso, muitos velhos
petropolitanos sopitar a comoção que lhes ocasionou o espetáculo chocante,
Fecharam-se
em seguida as portas da casa sacra, que, despida dos seus privilégios eclesiásticos,
está sendo demolida.
O
terrenos, em que tantos anos se ergueu a igreja da colônia serrana, será
retalhada em vários prazos, ao longo dos quais correrá, ao encontro do morro do
Cruzeiro – o morro do Imperador dos nossos antepassados – uma avenida de quatro
metros de largura, que finalizará na antiga rua Bourbon.
E
dentro em poucos meses, nada mais relembrará o passado daquele sitio de Deus,
venerabilíssimo ainda mais para todos os petropolitanos, sem distinção de
crenças, porque, naquele terreno junto à casa paroquial, reduziu-se a pó e
desapareceu, para todo o sempre, a cruz tosca de madeira, para ali
transplantada do Palácio de Cristal e, a cujos pés, em 1846, o internúncio apostólico
Bedini e o pastor protestante Avé-Lallemant celebrara, na praça da Confluência
os primeiros atos religiosos de Petrópolis.
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