terça-feira, 28 de maio de 2013

A VARIANTE DO CAMINHO NOVO DE BERNARDO SOARES DE PROENÇA

 Os preparativos para a abertura de um atalho no Caminho Novo com objetivo de amenizar o trajeto penoso da Serra do Couto e diminuir, assim o tempo de percurso do Rio de Janeiro à Minas Gerais, foram iniciados com a chegada ao Brasil do novo Governador e Capitão-General Ayres de Saldanha.
 De início foi pedido a Garcia Rodrigues Paes, para que se encarrega-se da obra, porém o mesmo não aceitou tal empreitada, alegando estar muito velho e doente e com falta de recursos financeiros.
 Nesse meio tempo, surgiu a preocupação no Velho Garcia Paes em relação as suas terras no Caminho Novo, entre os rios Paraíba e Paraibuna, dadas a ele em recompensa pela execução do Caminho Novo.
 Ele não tinha a pretensão em ter novas terras, mas sim proteger a sua posse definitiva. Garcia Paes acreditava-se que com as melhoras no caminho suas terras ficariam vulneráveis a cobiça de terceiros, devido ao aumento de trefego de cargas de alto valor, que esse atalho iria proporcionar. Porém três anos mais tarde a posse de suas terras foi devida devidamente assegurada.
 A ideia de ligar o Caminho Novo com a Baía de Guanabara, por meio do rio Inhomirim era bem antiga já de 1698. E voltando a ser colocado em pauta em 1703, acreditando que o desenvolvimento mais prático seria através da margem do rio Piabanha.
 Na carta de Sesmaria expedida em 11 de Junho de 1721, Ayres de Saldanha, o governador concede uma quadra-Padrão ao sargento-mor Bernardo Soares Proença e outra ao também sargento-mor Luiz Peixoto da Silva, que deveriam ser “locadas seqüencialmente por atrás da Serra do Frade e da Serra da Taucaya Grande, depois das terras da Sesmaria de Francisco de Mattos Filgueiras e João de Mattos de Souza.”
 A concessão dessas duas Quadras, sem dúvida alguma foram as duas primeiras da região da Baía do Piabanha, sendo o passo inicial para a ocupação das “terras serra-acima de Inhomirim”.
 Bernardo Soares de Proença, aproveitando as trilhas feitas pelos índios e as precárias veredas que ligavam a Freguesia de Inhomirim à Sesmaria dos Mattos, realizou a abertura de um caminho até as suas terras, estendendo até a propriedade de Luiz Peixoto da Silva, sendo assim considerado o embrião da Variante do Caminho Novo.
 Segundo as “Ordenações Filipinas”, os Caminhos Gerais, deveriam ser abertos e cuidados pelos sesmeiros ao longo do caminho, mesmo sendo do interesse do Governo-Geral.
 Como Garcia Rodrigues Paes recusou-se a tal empreitada, a abertura da Variante ficou a cargo do Sargento-Mor Bernardo Soares de Proença que se apresentou como candidato.
 A sesmaria confiada a Proença é datada de 11 de Junho de 1721, a partir “do alto da serra do mar até o ponto de confluência do rio Itamaraty e o rio Piabanha”, sua sesmaria ficou conhecida como Sesmaria do Tamaraty.
 A sesmaria de Luiz Peixoto da Silva também é datada de 11 de Junho de 1721, ficava logo depois da de Bernardo Proença, dividida pelo Caminho Geral entre os rios da Cidade e Araras.
 Essas duas sesmarias foram confirmadas pelo Rei de Portugal, em 12 de Julho de 1723 e 30 de Julho de 1726.
 Para dar inicio as obras, Proença foi acompanhado por mateiros, índios civilizados e escravos, as roças de Garcia Paes, pois ficou estabelecido que a Variante seria aberta a partir de Paraíba, atual Paraíba do Sul. O inicio do Atalho, ficava meia légua de onde ocorria o cruzamento do Rio Paraíba, que tempo depois passaria ser chamado de “Encruzilhada”, de onde era possível avistar a Pedra da Maria Comprida.
 Com auxilio de uma bússola, designaram o rumo SSE (Sur-sudeste) para a picada-base no alinhamento – Encruzilhada, Pedra da Maria Comprida, Rio da Cidade e Marco do Tamaraty.
 Logo no inicio das obras foi necessário fazer um desvio para a esquerda, afim de evitar as serras do Cavairú e das Onças, para se ter um acesso mais livre ao Vale do Rio Grande, hoje Sardoal e Fagundes, com o desvio pronto e uma curva acentuada para o Sul, as obras seguiram na busca de uma reaproximação do eixo – SSE, 157.5°, para o cruzamento do Rio Grande, aonde o rio fazia uma curva para Oeste, perto da Fazenda do Secretário.
 Passando para a margem direita, a empreitada seguiu pelas vertentes do Córrego da Maria Comprida até a sua nascente em Araras, na base da Pedra da Maria Comprida.
 Transpondo esse trajeto de 1.200 metros, a picada foi direcionada para perto da confluência dos rios da Cidade e Araras, próximo a picada de acesso a Fazenda do Rio da Cidade.
 Essa fase de abertura da picada-base do Atalho durou cerca de quatro meses. Para transformar a picada em caminho, Proença obteve ajuda de alguns moradores de Inhomirim, que já tinham sido procurados antes do inicio dos trabalhos, para os quais foram dadas seis sesmarias no trajeto da Variante entre Paraíba e o rio da Cidade.
 O fim das obras ocorreu em Outubro de 1724, sabendo-se que alguns arremates ainda seriam feitos ao longo da Variante, até 1725.

 Sendo assim a Variante do Caminho Novo, passou a cortar de Norte a Sul a Bacia do rio Piabanha, região que partir de então haveria um desenvolvimento territorial, graças ao fluxo de cargas e pessoas que fariam o trajeto Minas – Rio de Janeiro, dando origem assim a futura Petrópolis.





Bibliografia:

FROÉS, Carlos Oliveira. Petrópolis - A Saga de Um Caminho - I.H.P., 2005
VASCONCELLOS, Francisco de. Petrópolis, do embrião ao aborto. Volume 2. ParkGráfica Editora, 2008
ABAD, Vera. Petrópolis, Cidade Imperial. Prazedeler Editora, 2009




domingo, 19 de maio de 2013

CONTRATO DA PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO PARA A VINDA DE COLONOS EM 1844


Aos dezessete dias do mês de junho de mil oitocentos e quarenta e quatro, nesta Secretaria da presidência do Rio de Janeiro, compareceu o cidadão napolitano Eugênio Pisani, como representante da casa comercial de Carlos Delrue, estabelecida em Dunquerque a fim de contratar com este governo a importação de seiscentos colonos trabalhadores, para serem empregados nas obras publicas da província e depois de conferenciar com o respeitoso presidente, acordaram entre si no seguinte:

 Art.1° - O governo da província do Rio de Janeiro se obriga a pagar aos agentes da casa comercial de Carlos Delrue, do Rio de Janeiro, a quantia de duzentos e quarenta e cinco francos (245) por cada colono contratado na Europa e apresentado neste porto até perfazer o numero de seiscentos colonos trabalhadores, e bem assim que estes serão preferidos: igualmente pagará a metade dessa quantia (de 245 francos) por cada um filho desse casais que for da idade de 5 até 15 anos, contando que por parte do contratador e importador dos mesmos se observem as seguintes condições:

1ª. – Os colonos deverão ser ou portugueses ou belgas, franceses, italianos, alemães, 
espanhóis ou suíços e não serão menores de dezoito anos nem maiores de quarenta.

 2ª – Além de serem robustos e bem morigerados deverão ser oficiais dos oficiais de carpinteiro, ferreiro, pedreiro, canteiro e cavouqueiro e trabalhadores de estradas (terrassiers), sendo hábeis nesses ofícios.

3ª - Cada leva ou turma destes colonos não será menor de cem trabalhadores, nem maior de duzentos e a primeira leva deverá chegar ao Rio de Janeiro dentro de oito meses da data deste contrato, e a ultima dentro de dezoito meses, devendo o importador prevenir o governo da época provável da chegada do navio a este porto. (O agente Eugênio Pisani acompanhará os ditos colonos, não só para melhor inspeção sobre o tratamento deles, como para prestar esclarecimentos que a respeito forem exigidos). A metade de cada leva será composta de oficiais dos ofícios acima mencionados, em proporções pouco mais ou menos iguais, e a outra metade será de trabalhadores de estradas; os colonos trarão consigo ferramentas de seus ofícios.

4ª – Nenhum será contratado sem que o cônsul brasileiro respectivo o abone como bem morigeração, e reconheça nele todas as demais condições aqui exigidas e sem que intervenha no contrato que com eles fizer o empresário a fim de lhes fazer conhecer que o governo da província do Rio de Janeiro se obriga a pagar ao mesmo empresário suas passagens e de suas famílias, como um empréstimo que faz a eles colonos, obrigando-se os mesmos a virem trabalhar até pagarem essa soma adiantada e aquela que for necessário despender por conta deles colonos para sua manutenção desde o seu desembarque até, serem instalados nas ditas obras, o qual empréstimo será pago lentamente por meio de uma redução que o governo da província fará da quarta parte do salário que eles vierem ganhar, e este salário será o mesmo que ganham nas ditas obras outros trabalhadores de iguais misteres: nunca porém será menor de um mil réis por dia de trabalho aos trabalhadores, e de 1$280 rs. da moeda brasileira aos oficias de ofícios. Aos casados a dedução será feita pela quinta parte do que ganharem, e aos que tiverem mais de um filho far-se-á pela sexta parte. Ser-lhe á livre porém não só apressarem o pagamento, requerendo que a dedução seja feita noutra proporção, como mesmo desligarem-se inteiramente  da obrigação para com o governo da província, uma vez que contratando –se mais vantajosamente com particulares, estes paguem por eles o que estiverem devendo aos cofres da província. Os que tiverem pago aos ditos cofres pelas deduções dos seus salários poderão continuar a trabalhar nas obras da província, ou nas de particulares, seguindo melhor lhes  convier e se ajustarem. A sua chegada a este porto acharão casa e sustento até serem empregados nas ditas obras,e ainda até dois meses depois que o forem, se assim o exigirem; o sustento, porém,e qualquer outro socorro, entrará na conta de cada um, para ser pago ao governo da província pela maneira sobredita.

Art. 2° - Dar-se-ão cópias autênticas deste contrato ao empresário ou contratador, acompanhadas de ofícios desta presidência ao ministros brasileiros residentes nos países onde tiver de fazer-se o contrato com os colonos, a fim de que os ditos ministros, dando delas conhecimentos aos cônsules respectivos lhes expeçam instruções para o exato cumprimento das condições deste contrato, sob a responsabilidade dos mesmos cônsules perante o governo de Sua Majestade, O Imperador; ficando entendido que a apresentação das levas de colonos neste porto deve ser acompanhada de oficio do cônsul brasileiro respectivo, que acompanhe cópia do contrato do empresário com os colonos, feitos com intervenção sua e que indique o número dos colonos contratados seus nomes de suas mulheres legitimas (não se admite outras), e que além disto certifiquem estarem os colonos bem cientes de todas as condições do contrato feito com eles pelo empresário das obrigações a que se sujeitam para com o governo da província do Rio de Janeiro, e das que o mesmo governo contrai com eles.

Art. 3º - No mesmo dia em que se chegar a este porto o navio que conduzir os colonos, fará os agentes do contratador aviso ao presidente da província, a quem será entregue o oficio acima indicado do cônsul brasileiro; e verificado por ordem o presidente, por uma comissão de três indivíduos, se estão conforme as condições deste contrato, se desembarcados, o mais tarde até três dias depois da chegada do navio. Se por circunstancias imprevistas dor indispensável que se demorem a bordo por mais deste tempo, o governo da província pagará ao empresário, como indenização por alimentos 320 réis por cada um colono de cinco anos de idade para cima, a contar do terceiro dia depois da chegada do navio.

Art. 4° - Fica entendido que a soma de francos estipulada neste contrato pela passagem dos colonos, será paga conforme o cambio do dia da chegada do navio a este porto: outros sim que essa soma, e a de que trata o artigo antecede, no caso da hipótese dele, é a única que o governo provincial se obriga a pagar a Carlos Delrue, como indenização do seu trabalho e de quaisquer despesas que fizer com o contrato e condução dos ditos colonos até o porto do Rio de Janeiro. E fica mais entendido e estipulado que a falta por parte do empresário das condições deste contrato, no essencial dele, e sobretudo quanto a moralidade dos colonos, desobriga o governo da província para com o mesmo empresário. E de como assim convieram e contrataram, mandou o presidente da província lavrar este termo, que assinou com Eugênio Pisani, agente da dita casa comercial de Carlos Delrue, ao qual se dará cópia autêntica deste, além das que são dirigidas com oficio aos ministros do Brasil, na forma declarada no artigo 2.
 E assinaram comigo, secretário do Governo da Província, o Exmo. Presidente Aureliano de Souza e Oliveira Coutinho e o referido representante da casa comercial de Carlos Delrue, o napolitano Eugênio Pisani.

Antonio Álvares de Miranda, secretário
Aureliano de Souza e Oliveira Coutinho.
Por procuração de Carlos Delrue – Eugênio Pisani.




OFÍCIO A QUE SE REFERE O CONTRATO SUPRA.

Ilmo. e Exmo Sr. – Estando persuadido de que um dos meios de facilitar a emigração para o Brasil de colonos trabalhadores e industriosos é aquele de que lanço mão no contrato por cópia inclusa, para o qual estou autorizado pela legislação desta província do Rio de Janeiro, cujo governo Sua Majestade o Imperador se dignou confiar-me, tenho de rogar a V. Excia. se digne expedir instruções ao cônsul do império no porto ou portos onde o empresário tiver de contratar os colonos trabalhadores de que no mesmo contrato se faz menção (enviando-lhes cópias do dito contrato), a fim de que os colonos contratados venham inteiramente conforme as condições dele. Confio que V. Excia, reconhecendo a importância do objeto, e o quanto convêm que tais colonos, antes de serem contratados na Europa, tenham conhecimento das obrigações a que se sujeitam para com o governo, e das que este contrai para com eles; e bem assim que só venham para o Brasil colonos úteis e de reconhecida moralidade, não deixará de empregar todo o seu bem conhecido zelo pelo serviço público, para que na empresa em questão se consigam os fins que nela tem em vista o governo desta província, Deus guarde a V. Excia.
Palácio do governo da Província do Rio de Janeiro, aos 17 de Junho de 1844 –
Ilmo e Exmo. Sr. José de Araujo Ribeiro, enviado extraordinário e ministro plenipotenciário de S.M.I.
Na mesma conformidade aos demais ministros residentes nos lugares onde se devem fazer os contratos.

(Publicado no “Jornal do Commércio” do Rio de Janeiro em 21 de Junho de 1844)



D. PEDRO I E PETRÓPOLIS

Alcindo Sodré 


Não se dispunha, pelo título destas notas que vamos tratar das relações do nosso primeiro imperador e a povoação de Petrópolis, e muito menos do projeto de José Bonifácio apresentado à Constituinte de 1823 lembrando a conveniência da metrópole imperial ser edificada no coração do país, e poderia ter o nome de “Petropole”, em homenagem ao autor da independência. Vamos cuidar de Pedro I com Petrópolis ainda Rio Seco e Córrego Seco, conforme as denominações da época, Petrópolis que haveria de ser em consagração ao filho, já que não pôde ter sido ao pai.
 Charles Ribeyrolles, das perguntas que fez ao velho tropeiro do alto da serra, José Antonio Furtado, obteve entre outras a seguinte resposta: “Era um grande caçador e um guapo caminheiro o sr. D. Pedro I; ele acabou a estrada velha, que conduz da Raiz da Serra até o Alto, e que seu pai D. João VI tinha aberto; mas não é que ele tinha o pé afeito ás montanhas o imperador, e não lhe metiam medo as picadas. Não era um verdadeiro tropeiro ele, pois que era imperador, mas era um gosto vê-lo se meter nas florestas a dentro. Ele aqui vinha muitas vezes ano, nos matos perdido, com diziam na cidade, e ia visitar o seu amigo o padre Corrêa, que tinha uma fazenda mais além, mesmo no lugar de muda de vossas diligencias, entre Petrópolis e Pedro do Rio. Ora um dia que voltando com a segunda imperatriz, parara em Córrego Seco, disse-lhe ela que o ar era bom e o lugar belíssimo D. Pedro, que tinha a mão ao pé da língua, disse duas palavras a José Maria, o Major, deu-lhe 20 contos de reis e ficou-se com a fazenda; era um capricho e um bom negócio.
O folhetinista da “Gazeta de Petrópolis” de 1883 escrevendo sobre a “Origem, fundação e desenvolvimento da colônia de Petrópolis.” Adiantou: “ Na sua ida para a residência do padre Corrêa, a 4 de Dezembro de 1829, ao chegar ao alto da serra da Estrela, mui cansado, após penosa subida por péssimo caminho e tendo com a maior satisfação apreciado o magnífico panorama que dali se descortina, manifestou D. Pedro desejo de construir um palácio nesse lugar e para isso comprou um terreno a Antonio Correa Maia por 2:400$00.”
Raffard, por seu turno, adianta: “No dizer de outro informante o sr. D. Pedro I tornou a ver o Córrego Seco em 29 de Dezembro de 1829, quando levava para a fazenda dos Corrêas, uns 13 quilômetros mais para o interior, a Família Imperial, por ter sido ordenada uma mudança de ares á Princesa D. Paula.”
J. Tinoco, em seu “Guia de Viagem”, refere-se à viagem que a 25 de março de 1822 fez da Corte a Minas Gerais o imperador Pedro I, o qual, quando chegou ao Alto da Serra, não só pode restaura-se das fadigas, de uma jornada apreciar um panorama que lhe sugeriu a ideia de construir um palácio naquele belíssimo lugar. E referindo-se também a enfermidade da princesa D. Paula, fala na viagem imperial de 4 de Dezembro de 1829.
C.S. Sterwart, em sua obra editada em 1895, “Brazil and La Plata”, diz que Pedro I teve a intenção de colonizar com alemães a fazenda do Córrego Seco, mas sua abdicação impediu o fato.
Não encontramos nenhum elemento para confirmar esse projeto de D. Pedro I, que nos parece ser fruto de possível confusão do autor. As de declarações dos demais referidos publicistas, são, pelo menos, verossímeis. Que Pedro I viesse várias vezes ao Córrego Seco é ideia perfeitamente aceitável dado o seu temperamento aventureiro e a sua natureza física. O desejo de adquirir terreno para construir palacete é natural, e conseqüentemente dos passeios que por ai dava. A aquisição de um, por 2:400$000 a Antonio Corrêa Maia, é circunstancia de que ainda não achamos provas. A viagem a Corrêas em 1829, por conta da moléstia de uma filha e a resultante compra do Córrego Seco não padece dúvida.
Houve, entretanto, duas passagens de Pedro I pelo Córrego Seco que não foram descritas pelos cronistas de Petrópolis, e no entanto tem elas grande valor histórico nacional, sem desprezar-se a repercussão local, que foi digna de nota. Foram as ocorridas em 26 de Março de 1822 e a 30 de Dezembro de 1830.
A primeira, como vimos, foi registrada por Tinoco e Raffard, erradamente, diz que ela se efetuou em Março de 1825.
A 26 de março de 1822 Pedro I passa a primeira vez, pelo Córrego Seco, ainda como príncipe regente, a caminho de Vila Rica em missão política de relevância. Pernoitou na fazenda da Cordoaria, Raiz da Serra, e a noite seguinte passou na fazenda dos Corrêas. Entre os acontecimentos do 1822 que tiveram decisiva repercussão no 7 de Setembro, destaca-se a ida do príncipe D. Pedro I a Minas Gerias.
“Com essa viagem, diz Varnhagem, havia-se operado no animo do príncipe uma transformação radical. Encerrando que vivia entre as montanhas do Rio de Janeiro, absorto contemplava o príncipe, em Minas Gerais, a grandeza e a vastidão do Império virgem que a Providência lhe reservava, nesses panoramas que se sucediam a seus olhos.”
Recebido com festa em São João Del Rei e Queluz, teve a ventura de submeter a Junta de Villa Rica, reconhecendo assim Minas Gerais a legalidade da sua regência e aplaudindo os seus projetos de liberdade e constituição.
Nessa viagem, ele foi acompanhado do desembargador Estevam Ribeiro de Rezende, mais tarde, Marquês de Valença; de Teixeira de Vasconcellos, ouvidor de Sabará, vindo a ser Visconde de Caeté; de José de Rezende  e o padre Belchior Pinheiro, deputados da Corte e o último, sobrinho de José Bonifácio, do guarda-roupa Berquó, mais tarde, Marquês de Cantagalo; um criado particular, um moço de estrebaria e 3 soldados. A frente da comitiva, adiantados, iam dos cargueiros com roupas, guiados por um sargento.
O príncipe não quis levar cozinheiro, nem regular suas paradas: comeria que o encontrasse pelo caminho e dormiria em esteiras se fosse necessário.
Em 30 de Dezembro de 1830, D. Pedro I, a Imperatriz Amélia e sua comitiva passaram pelo Córrego Seco seguindo para Minas Gerais, onde os levavam fatos já ligados ao futuro sucesso de 7 de Abril. Partiram para essa viagem a véspera, do cais de São Cristovão às 8 horas da manhã, para o porto da Estrela.
Acompanharam nessa viagem às Minas, as seguintes pessoas: o ministro do Império Silva Maia; a Baroneza de Stcomfeder; camarista Luiz Pinto Guedes; veador da Imperatriz Lázaro José Guedes; Francisco Dietz; Maria Stab; Tremisson; Nani; José Maria Lobo, resposteiro; dr. Tavares; capelão-cônego Camélio e mais 5 criados particulares; a uxaria e mantearia.
Chegaram à Fábrica de Pólvora às 3:20h da tarde e às 6 horas da manhã do dia 30 partiram para a fazenda dos Corrêas, onde chegaram às 11:20h, depois de uma jornada penosa devido ao mau tempo e o estado do caminho. Partindo de Corrêas depois das 7 horas da manhã de 1° de Janeiro às 11:45h, chegaram à fazenda do Secretário.
Em Corrêas e por intermédio do ministro do Império. Pedro I toma uma providência administrativa de caráter local, por certo a primeira do gênero, relativa às paragens da futura Petrópolis.

"Attendendo ao incalculável prejuízo que, com perdas de fazendas e perigo de vida resulta da falta da ponte que houvera sobre o rio Morto da fazenda do Corrêa e estradas de Minas Gerais, e a urgentíssima necessidade de se construir outra para facilitar e segurar o transito das muitas tropas e viandantes que giram desta para aquella da Villa de S. Pedro de Cantagallo, que sem perda de tempo dê todas providências, que são de suas attribuições, sobre a referida ponte, procedendo immediatamente as diligencias ordenadas pelo seo regimento e pela Lei de 20 de Agosto de 1828; e dando parte de tudo o que se fizer, e das dúvidas e obstáculos que se lhe offerecem pela secretaria de estado dos negócios do Império.
Fazenda do Corrêa, 30 de Dezembro de 1830.
José Antonio da Silva Maia.”

Da viagem de 1822, vimos que um dos membros da comitiva de Pedro I foi o desembargador Estevam Ribeiro de Rezende, mais tarde Marquês de Valença. Esse titular, em 9 de Julho de 1850, viria a ser foreiro em Petrópolis, obtendo 1.198 braças quadradas, desmembradas do prazo 2.201, pertencente a Honório Hermeto Carneiro Leão, Marquês de Paraná, grande do Império, que foi o registro n° 1 dos foreiros de Petrópolis, que pagava por este prazo 5$450 desde de 1 de Janeiro de 1846, registrado pelo escrivão Ribeiro Cirne e assinado por Koeler, José Luiz de Azeredo Coutinho e João Gustavo de Frontin. Situado no Palatinado Inferior, fazia frente para a Rua do Honório e fundo para a Rua do Imperador e lado para o rio do Córrego Seco. Além da parte desmembrada para o Marquês de Valença, houve outra de trinta braças para Henrique Carpernter e o restante em 27 de Maio de 1882 a 25 de Abril de 1884 passou  respectivamente à Companhia Estrada de Ferro Príncipe do Grão Pará e a Christiano Benedcito Ottoni.

Fonte:
Trabalhos da Comissão do Centenário – Vol II –1939. 





quinta-feira, 16 de maio de 2013

TRÊS FASES DE PETRÓPOLIS: EM 1844, 1851 E 1858.


DEPOIMENTO DO DR. ROBERTO AVE-ALLEMANT*

Em Janeiro de 1858, fiz meus pequenos preparativos de viagem, indo em fevereiro a Petrópolis para agradecer a Sua Majestade e despedir-me.
Muito me emocionou Petrópolis, visitada agora pela terceira vez.
Em outro tempo, fora o nome de Petrópolis muitas vezes mencionado na imprensa alemã e tantas vezes explicada em livros de viagem que não me deteria um momento a considerá-lo, se não tivesse visto o desenvolvimento do lugar em diferentes fases.
Creio que foi em 1844 que, alta noite, recebi uma carta urgente chamando-me imediatamente a Mandioca, a fim de ver ali, o irmão do meu amigo Major Júlio Frederico Koeler (tão prematura e desgraçadamente falecido), o qual recebera forte contusão na mão. A ida ali era, aliás uma viagem, mas o chamado era urgente; e sabendo-me solicito  a todos os apelos, meu amigo e por terra e tudo prepara para esse fim.
O original empreendimento emocionou meu irmã, então Pastor da comunidade alemã e sucessor do inditoso L. Neumann, e meu erudito, espirituoso e jovial amigo Professor Barão Tautphoeus. Pela 10 horas da noite, saímos baía afora numa grande falua, um barco de dois mastros com uma meia coberta, onde se arrumara uma cama muito cômoda. A lua subia e trazia-nos uma bela noite de viagem. Dormindo, seguimos pelo pequeno Rio Inhomirim acima até o lugarejo Vila da Estrela, onde às 5 horas da manhã chegamos e despertamos. Aí aguardavam-nos cavalos de sela; em mau caminho viajamos umas três léguas e paramos em frente da cada da Mandioca, da propriedade que foi de Langsdorff.
Era felizmente insignificante o auxilio médico e tomou pouco tempo. Mas demorou o almoço pois os alemães – e éramos quase todos alemães – gostam de comer e ainda mais de beber muito.
Durante o almoço o incansável Major Koeler falou na fundação de uma Colônia alemã no alto, no centro da serra, que ficava acima de nossas cabeças e de um novo caminho para lá, que devia ser fácil e seguro para a passagem de carros.
Naturalmente isso tinha de ser visto com os próprios olhos, levantamo-nos todos imediatamente  depois do almoço e acompanhamos o nosso engenheiro floresta a dentro.
Realmente majestosa era a floresta e horrível o caminho. A picada aberta toscamente; milhares de arvores abatidas. Alguns blocos de pedras rolados outros rebentados com pólvora. Terra escavada acumulara-se de novo e em alguns lugares cavados tinham-se aberto grandes frestas; o conjunto oferecia um quadro destruição; parecia que um tremor de terra abalava a montanha. E isso deve tornar-se uma estrada carroçável. Eu abanava a cabeça. Duvidava que encontrássemos um único ponto com um bom trecho de caminho pronto.
Lá no alto encontramos a antiga estrada empedrada, celebre pela viagem de Spix e Martius. Do pico descortinava-se uma vista grandiosa, porém não bastante livre para um largo panorama. Aqui devia funda-ser a colônia alemã e formar-se um vila de 2.000 habitantes.
Nessa solidão, no meio da floresta, em plena serra, isso é fácil de dizer, mas não é fácil de crer.
Muito nos divertiu o otimismo de Koeler, o bom Major Koeler, que via a coisa como um fait accompli; e com o magnífico tempo da tarde descemos de regresso a Mandioca, onde dana Maria do Carmo, à espera do nosso Major, mandara preparar para nós um saboroso jantar de caça.
Depois de um dia a todos os respeitos tão agradável, era natural que os três eruditos alemães se levantassem mais tarde. Pelas 10 horas da manhã, estávamos na falua e descemos o Inhomirim. Mas ao chegarmos à embocadura sobreveio uma tempestade que prendeu no “hotel” grande número de barqueiros. No quarto de hóspedes de uma casa bem arranjada.
Depois de bordejar desagradavelmente na baia, e não sem perigo por trás da Ilha do Governador, chegamos ao Rio ao amanhecer.
Sete anos mais tarde em dezembro de 1851, sofri uma mortal insolação. O meu espirituoso e vantajosamente conhecido Dr. Sigraud, que me tratou juntamente com as sumidades médicas Drs. Persiani, Paula Cândido e Tomás Gomes dos Santos, mandou-me para Petrópolis afim de que me restabelecesse mais rapidamente.
Em vez de falua, um barco a vapor me conduziu através da baía até o Porto da Estrela. Entre os companheiros de viagem contavam-se senhoras e crianças. Na ponte de desembarque estacionavam vários cocheiros alemães com carros puxados por quatro cavalos e à margem do rio brasileiro havia uma pequena algazarra germânica.
Embora o caminho da planície deixasse muito a desejar, nele se podia viajar comodamente. No pé da serra havia cavalos de muda. Com grande surpresa vi uma boa estrada de rodagem verdadeira obra-prima no gênero, com audaciosas curvas, galgando a serra com a maior segurança, tão suavemente, que durante todo o caminho se podia trotar com bastante vivacidade.
E quando cheguei à ultima crista, a uma slatura de 2.500 pés, e o carro desceu lentamente para o antigo Córrego Seco num lugar encantador, com casas babitáveis e uma Praça do Imperador em construção, vários hotéis, duas igrejas, com 2.000 moradores – pensei, então com profunda melancolia, no Major Engenheiro Julio Frederico Koeler.
Com profunda melancolia – digo eu. Muito honradamente cumprira ela a palavra, muito conscienciosamente desempenhara sua difícil tarefa. Mas já não estava no número dos vivos. Num domingo de manhã fazia exercício de pistola com amigos e, num momento infeliz, parou diante do alvo quando atirava o seu melhor amigo. A bala atingiu na axila e poucas horas depois morria ele com varonil serenidade.
O Major Julio Frederico Koeler, foi um dos poucos oficiais alemães que em longo tempo de serviço em terra brasileira sempre cumpriu o seu dever. Todos podem tomá-lo por modelo. Era homem de sólidos conhecimentos e de variada educação, fiel aos seus amigos em todas as ocasiões. Hospitaleiro, as suas casas em Itamarati e Petrópolis estavam sempre abertas. Contava por isso muitos amigos e muitíssimo papa-jantares e entre os ultimo muitos inimigos, porque o invejavam. Com sua morte emudeceram todos, enquanto seus amigos o lamentavam com verdadeiro pesar e o recordam com respeito.
Que todos os transeuntes da Estrada da Serra e visitantes da Colônia de Petrópolis tenham para o falecido um pensamento de estima e amor, pois percorrem e visitam o monumento de Koeler.
Quando outra vez fui a Petrópolis em fevereiro de 1858, sete anos depois, tinha já o lugar relações inteiramente diversas com o Rio e com o interior e tomara proporções muito diferentes.
No desembarcadouro da Prainha, na Cidade do Rio, construiu-se um grande alpendre para embarque de passageiros e bagagens. Um veloz barco a vapor recebeu os passageiros e a carga e atravessou a baía mais rapidamente do que antes acontecia. Aportou no lugar, ao nordeste do Inhomirim. Ali já está pronto o trem; sobe-se e depois de um viagem de 20 a 23 minutos chega-se à estação ao pé da serra.
Imediatamente, a estrada de ferro se liga a estrada de rodagem por meio de carros e animais de sela. A longa fila de carros subiu a serra e em Petrópolis dispersou-se para diferentes hotéis e casas particulares.
Como se tornara aprazível esta Petrópolis que era outrora a mata solitária do Córrego Seco! Num país como o Brasil, cujo desenvolvimento se opera em bela escala, porém sem a rapidez do americano, difícil é compreender tal metamorfose.
O número de habitantes de Petrópolis pode ser comportado hoje em 7.00. são cerca de 2.700 alemães, e 3.000 portugueses; os restantes franceses e ingleses, etc.
Por isso Petrópolis teve de sacrificar bastante o seu antigo tipo germânico. Aliás pode dizer-se malogrado o seu destino como colônia agrícola lucrativa. O solo é estéril, limitado, escarpado; a vegetação antes botanicamente atraente e soberba que agricolamente lucrativa. Cuida-se mais da indústria. Desenvolveram-se várias pequenas artes, oficinas e empresas. Por uma razão muito simples, é muito vantajosa a proximidade com a Capital do país.
Petrópolis fica na serra a mais de 2.000 pés de altura, e goza de todas as vantagens de salubridade de um clima de montanha. Ainda que o clima seja um tanto caprichoso e inconstante, e caiam chuvas freqüentes em todas as estações, o ar no alto da serra é deliciosamente puro e revigorante e água potável maravilhosa.
Ambas essas bênçãos do céu no meio de uma grandiosa natureza serrana deram a Colônia a sua peculiar importância.
Sobem para Petrópolis e lá convalescem todos os que no Rio, estão doentes, fracos, debilitados pelo clima ardente, ameaçados pela febre amarela, fatigados pelas preocupações. Ela é o Weltvreden, o Buittenzorg do Rio de Janeiro e o seu meio humano, o seu local de vilegiatura, o seu balneário, os seus estabelecimentos hidroterápicos, não sofrem ainda o metódico charlatanismo dos balneários europeus e queira Deus que nunca o sofram!
Diversos hotéis ornam a cidade. Muitos Colonos alugam partes de suas casas ás aves de arribação do Rio. Aliás grande numero de casas magníficas é de propriedade de distintas famílias do Rio de Janeiro.
Entre estas, ocupa o primeiro lugar o Palácio Imperial, que não é propriamente um palácio, mas um castelo muito limpo e aprazível habitado pela Família Imperial nos meses quentes de dezembro a abril.
Acompanha a Família Imperial uma multidão de pessoas de alta categoria, diplomatas, etc. e ás vezes é muito difícil achar em Petrópolis um quarto, um abrigo. Além disso, na cidadezinha a vida é cara; em certas épocas alguns viveres tem de ser pagãos a peso de ouro; e freqüentemente ocorre que gêneros vindos do campo para a cidade, como ovos, por exemplo, são trazidos pelos que visitam a colônia do Rio de Janeiro para Petrópolis.
Nessa época é Petrópolis maravilhosamente linda, foi quando lá me achei , em fevereiro de 1858.
Subira numa tarde de sábado e tive forçosamente, de hospedar-me em casa do cunhado do meu irmão, um bem educado funcionário brasileiro, cuja esposa, de descendência anglo-americana, não ficava a dever, em cultura, a nenhuma dama parisiense e, em economia doméstica, a nenhuma senhora alemã.
Que agradável domingo vivi eu! A serra estava fresca e fria. O orvalho cintilava nos montes e vales e escorria de todas as folhas. Nos bairros da Colônia, de nomes genuinamente alemães, Palatinado, Vestifália, etc., ao longo do rio pulsava vida alemã e louras cabecinhas alemães corriam para cá e para lá onde quer que, em meu passeio matinal, dirigisse os meus passos.
Fomos depois á igreja protestante. A pequena e acanhada casa de orações estava cheia de gente que, com o acompanhamento de um pequeno órgão, cantava tão devotamente o seu: “Liebster Jesu, wir sind hier, etc.”, que certamente a todos o Senhor terá ouvido e atendido. Em seguida pregou o meu velho e fiel amigo Jakob Daniel Hoffmann, jovialmente, sobre o Bom Pastor; jovial parecia o sol do Evangelho nos corações dos homens e o sol do céu penetrava pelas janelas e por alguns buracos do teto.
Depois do sermão, perto da casa de Deus, um vai e vem puramente alemão me alegrou a alma. Revê-se exatamente, nos diversos grupos, o Palatinado do Reno: os mesmos longos sobretudos, os mesmos cachimbos curtos dos homens, os mesmos vestidos sem talhe e porte das camponesas, as mesmas engraçadas figuras de crianças de olhos azuis abertos, com sardas e nariz sujo.
Sua Majestade o Imperador, recebeu-me com sua bem conhecida benevolência e dele me despedi para seguir viagem.
Devo fazer aqui uma observação sobre a maneira como o Imperador atende, ouve e considera os desejos, pedidos e petições que sem trabalho e sem dificuldade lhes são levados quer em São Cristóvão, quer em Petrópolis!
O Imperador pertence a todos e por isso todos pertencem ao Imperador! A afirmação é verdadeira e ele bem pode ser aquele conde, cantado pelo poeta sábio, que podia consoladamente repousar a cabeça para dormir no seio de cada súdito e a quem, entusiasmados e comovidos exclamaram os outros príncipes:


“Graf im Bart, Ihr seid der Reichste,
Euer Land Traegt Edelstein!”
("Conte a barba, você é a pessoa mais rica
O seu país tem uma jóia!)


Fomos à tarde a Praça de Koblenz.
É uma praça grande limpa, sombreada por grandes árvores da floresta. Quando os primeiros colonos começaram a derrubar a mata foi aqui celebrado o primeiro serviço religioso católico e protestante e meu irmão, então pregador da comunidade do Rio, celebrou o primeiro casamento ao ar livre. Uma grande cruz branca assinala o lugar onde os imigrantes, que pobres como Jacó, haviam chegados a este lugar estrangeiro, primeiro tinham olhado para o Senhor.
Quando o Imperador está em Petrópolis, a Banda Musical de Musica Imperial toca na praça. Ali se vêem lindos grupos. A alta sociedade,  perfumados cavalheiros de “lorgnette” e amazonas de cinta de vespa passeiam a cavalo. Na relva brinca os pequenos. Mocinhas louras, seis a oito braços, braços dados passeiam elegantemente e cochicham segredos, alegrias e dores da semana passada: assim parece pelo menos, porque quando a gente se aproxima, elas se calam para não serem executadas.
Maravilhosamente soam os acordes da música ao ar livre! Fiquei surpreendido, alegre e entusiasmado com tudo o que via e ouvia. Ninguém mais do que eu o sentia; pois no meio do povo alegre morigerado, da praça asseada e da harmoniosa musica, pensava no Córrego Seco que há catorze anos e na então solitária floresta. Operara uma mudança mágica.
Segunda-Feira de manhã, muito cedo, teríamos de separar-nos da aprazível cidadezinha serrana e de seus amáveis habitantes.
Quando chegamos á garganta, ao portão de pedra ao passo da serra, estava a região abaixo de nós iluminada pelo sol da manhã com toda a pompa, toda a majestade. Em baixo os contrafortes da serra, a planície até a baía , a própria baía, as montanhas do Rio distante e, afinal, ainda o distante oceano; tudo deveria ser visto em sua imensurável extensão. Em nenhuma outra parte do Rio existe mais sublime quadro da natureza.
Com o fresco ar matinal rolavam os carros rapidamente, serra abaixo, para regiões mais quentes e, poucas horas depois, estávamos nos vagões da estrada de ferro, rumo ao Rio.


(VIAGEM PELO SUL DO BRASIL NO ANO DE 1858, por Roberto Ave-Lallemant, 1º volume, páginas 74 a 81, edição do Instituto Nacional do Livro, Rio de Janeiro, 1953, Tradução de Teodoro Cabral)

*Robert Christian Ave- Lallemant - (Lübeck, 25 de julho de 1812 — Lübeck, 10 de outubro de 1884) foi um médico e explorador alemão
Filho dos professores de música Jacob Heinrich Avé-Lallemant e Friederike Marie Canier. Irmão do criminalista Friedrich Christian Avé-Lallemant e do crítico musical Theodor Avé-Lallemant.
Assim como seu irmão frequentou em sua cidade natal o Katharineum, tendo ao mesmo tempo educação musical com seu pai. Iniciou o curso de medicina em Berlim, mudando em seguida para Heidelberg. Após um semestre de estudos em Paris, completou seus estudos e em seguida fez doutorado em Kiel.
Em 1836 estabeleceu-se no Brasil, como médico no Rio de Janeiro. Alguns anos depois foi diretor de um sanatório para doentes de febre amarela. Foi então convocado para trabalhar no conselho de saúde do império.
Em 1841 casou no Rio de Janeiro com Meta, filha de Moses Löwe, com quem teve três filhos. Como sua mulher não suportava bem o clima brasileiro, a família retornou em 1855 para Lübeck, falecendo sua mulher no mesmo ano. Após o ano obrigatório de luto, Avé-Lallemant casou em 11 de abril de 1856 com Ida Louise Löwe, irmã de sua falecida mulher, com quem teve 2 filhos.
Em Lübeck teve contato com Alexander von Humboldt, que o convidou para participar da expedição Novara para o Brasil. Avé-Lallemant abandonou a expedição no Rio de Janeiro, iniciando então a viajar sozinho pelo Brasil. Estas expedições foram apoiadas pessoalmente por D. Pedro II.
Em 1858-1859 Avé-Lallemant retornou novamente para Lübeck, abrindo um consultório em 1859. Em 1869 foi convidado, novamente sob incentivo de Humboldt, para a cerimônia de inauguração do Canal de Suez. Em 1871 faleceu sua segunda mulher, com 54 anos de idade, tendo ele casado um ano depois com Adamine Ulrike von Rosen.
Avé-Lallemant não é conhecido somente por suas viagens exploratórias pelo Brasil, mas também por ter influenciado o sistema de saúde brasileiro.


Bibliografia:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Robert_Christian_Av%C3%A9-Lallemant


quinta-feira, 9 de maio de 2013

REGULAMENTO DA IMPERIAL COLÔNIA DE PETRÓPOLIS EM 1847


Tendo nesta data aprovado com as modificações e aditamento que julguei convenientes, o projeto de regulamento para a IMPERIAL COLÔNIA DE PETRÓPOLIS, e a 2ª Seção da Estrada Normal da Estrela, que me foi proposto pelo conselho diretor das obras da dita estrada, assim o comunico ao mesmo conselho para seu conhecimento e execução.

Petrópolis, 26 de Maio de 1847.
Ass. Dr. José Maria da Silva Paranhos

Tendo a experiência mostrado que os regulamentos e ordens que ora regem a Imperial Colônia de Petrópolis, e as obras da 2ª Seção da Estrada Normal da Estrela, dão abertas a alguns abuso e faltas que muito convém remover e evitar o Vice-Presidente da província do Rio de Janeiro, tomando em consideração quanto lhe foi ponderado pelo Chefe da dita Seção, e Diretor da Colônia, e à vista do que pessoalmente tem observado, resolve que se execute o presente regulamento desta mesma data.

Petrópolis 26 de Maio de 1847
Ass. Dr. José Maria da Silva Paranhos.

REGULAMENTO PARA A IMPERIAL COLÔNIA DE PETRÓPOLIS E 2ª SEÇÃO DAS OBRAS DA ESTRADA NORMAL DA ESTRELA.

ARTIGO 1º. – A direção cientifica, administrativa e policial da Colônia continua a cargo de um Diretor, que será ao mesmo tempo o Chefe da 2ª Seção das obras da Estrada Normal da Estrela enquanto isso convier.

ARTIGO 2°. – Ao Diretor incumbe fazer executar as ordens e regulamentos do Governo, promover quanto em seu couber o desenvolvimento da Colônia, e zelar os interesses provinciais, correspondendo-se diretamente com a Presidência, e dando-lhe conta de todos os seus atos.

ARTIGO 3°. – Subordinados ao diretor, haverão na Colônia e Seção os seguintes empregados:
§ 1°. – Um Vice-Diretor que substituirá o Diretor quando impedido, em todas as suas atribuições, e a quem pertencerá especialmente a parte econômica da Colônia e Seção como compras, alienações e pagamentos, fiscalização da enfermaria e armazéns, etc.
§ 2°. – Um escrivão encarregado de organizar e registrar as férias da Colônia e Seção de escrever e registrar a correspondência ativa e passiva, etc.
§ 3°. – Outro escrivão encarregado da escrituração dos colonos, da confecção das contas correntes de um deles, da organização das tabelas de pagamentos, quitações, descontos, etc.
§ 4°. – Quatro engenheiros condutores, encarregados de delinear as obras, levantar as plantas, desenhar, dividir o serviço em tarefas, orçar, atestar o importe das tarefas, fiscalizar e dirigir a execução dos trabalhos.
§ 5°. – Um médico e um enfermeiro para tratar dos doentes da Colônia e seção, e de quaisquer outros desvalidos que por ordem do Diretor forem recebidos no hospital.
§ 6°. – Um fiel encarregado do armazém e dos pertences da Colônia e Seção.
§ 7°. – Quatro apontadores que serão encarregados do ponto diário do pessoal, e de transmitir e publicar as ordens da diretoria.
§ 8°. – Tantos burgomestres (uma espécie de prefeito do quarteirão) quantos os quarteirões em que for dividida a Colônia.

ARTIGO 4° - Compete aos burgomestres:
§ 1°. – Manter a ordem e sossego entre os colonos instruí-los e aconselhá-los.
§ 2°. – Fazer executar pelos colonos as ordens do governo e da diretoria e especialmente as disposições policiais do contrato de aforamento celebrado com a Imperial Mordomia.
§ 3°. – Formar a estatística de seu quarteirão e informar à diretoria das precisões dos colonos, passando-lhes atestados.
§ 4°. – Efetuar elos colonos a distribuição de sementes, plantas e outros dons gratuitos que lhe sejam feitos.
§ 5°. – Fiscalizar e dirigir os trabalhos dos colonos de sua turma, assistindo ao serviço e dando exemplo de assiduidade e destreza.

ARTIGO 5°. – Cada escrivão poderá ter um amanuense, que o coadjuvará, e que será despedido logo que não seja preciso.

ARTIGO 6°. –  O Vice-Diretor, os escrivães, os engenheiros condutores o médico, serão contemplados nas férias com 800$000 de ordenado anual; o enfermeiro, os apontadores, o fiel e os amanuenses com o de 40$000 mensais, e os burgomestres que exercerem todas as atribuições do Art. 4°. em mais de um quarteirão, com 1$600 por dia; os que exercerem as mesmas atribuições em um só quarteirão com 1$400 por dia e os que só exercerem as atribuições dos §§ 1°., 2°., 3°. e 4°., com 4$000 de salário mensal.

ARTIGO 7° - Continuarão a haver na Colônia até oito escolas, duas de meninas exclusivamente, e as outras seus de discípulos de ambos os sexos. Estas escolas serão regidas provisoriamente por colonos dos mais habilitados e na sua falta absoluta, por quaisquer pessoas que entendam o alemão. Para elas concorrerão como até agora promiscuamente nas segundas quartas, quintas e sextas-feiras os discípulos dos diversos ritos religiosos; mas nas terças e sábados freqüentarão os católicos, e os evangélicos as dos mestres evangélicos. Nestes últimos dias se ensinará exclusivamente a doutrina religiosa, e nos outros, a ler escrever e contar. Em uma das escolas se ensinará aos meninos mais adiantados e inteligentes, elementos de geografia e história, aritmética e geografia desenho e o uso da agulha magnética.

ARTIGO 8° - Os mestres e mestras provisórias terão de ordenado mensal de 30 a 40$000.

ARTIGO 9° - Haverá também uma escola de música na qual se ensinará gratuitamente aos meninos colonos e brasileiros a prática dos instrumentos e a cantar, não devendo a diretoria despender com ela mais de 400$000 anuais.

ARTIGO 10° - A diretoria fica autorizada a construiu casas de escolas pelo interior da Colônia por conta da consignação; a provar as escolas de papel, tinta e penas, tabuadas e livros elementares precisos; assim como a continuar a abertura e o melhoramento dos caminhos e a fatura das pontes do interior da Colônia.

ARTIGO 11° - A diretoria é permitida socorrer aos colonos mais indigentes, atrasados por moléstias ou carregados de grandes famílias, com sementes e plantas, e coadjuvá-los na confecção de suas casas.

ARTIGO 12° - À Diretoria incumbe facilitar aos colonos o exercício de sua religião, convidando sacerdotes e pastores para este fim, fazendo para isso as despesas que forem necessárias, enquanto não houverem na Colônia curas pagos pelo governo.

ARTIGO 13° - Cabe ao diretor nomear interinamente, e ao Governo definitivamente, o vice-diretor, os engenheiros-condutores, os escrivães, o médico e o fiel. A escolha e demissão, porém dos apontadores, amanuenses, enfermeiro, mestres e mestras de escolas provisórias, de ofícios e dos burgomestres, é da privativa atribuição do Diretor; todavia é do seu dever procurar que os burgomestres sejam pessoas bem aceitas dos colonos.

ARTIGO 14° - Todos os empregados da Colônia e Seção, os burgomestres, mestres de escola e de ofícios, prestarão juramento de bem servir perante o Diretor, do que se fará termo em livro especial. Os empregados de nomeação definitiva do governo, e os apontadores usarão como distintivo de uma sobrecasaca de pano azul e botões amarelos com as armas do Império, e de boné do mesmo pano com galão de ouro. Os mais empregados e mestres, usarão só de boné e na frente deste de uma chapa de cobre dourada com as letras I.C.P. (Imperial Colônia de Petrópolis).

ARTIGO 15° - Nenhum empregado pode ausentar-se de Petrópolis sem licença do Diretor, e esta deverá não exceder de oito dias por cada mês; o quando haja precisão de licença maior será ela requerida ao governo por intermédio do Diretor, e com sua informação.

ARTIGO 16°. – À Diretoria é permitido conceder aos colonos, ainda obrigados à província, licenças ilimitadas para abrigaram seus serviços fora de Petrópolis, contanto que o colono fique sujeito a comparecer logo que o governo o ordene. O diretor deve ter muito em vista que meninos ou meninas de idade menor somente vão para o poder de locadores, cuja moralidade seja notória; e exigirá sempre que nas condições  de qualquer contrato de serviços pessoais se estipule a de se facultar ao locatário ocasiões de freqüentar escolas e ensino religioso.

ARTIGO 17° - Nenhum colono obrigado à província pode ausentar-se de Petrópolis sem prévia licença da diretoria; e, fazendo-o poderá ser preso e reconduzido judicialmente à Colônia.

ARTIGO 18° - O colono que não mandar para as escolas seus filhos ou filhas maiores de sete anos e menores de dozes, três dias pelo menos na semana, sofrerá a multa de 40 reis a favor da Caixa de Socorro Mútuo por cada um dos três dias que o deixou de fazer.

ARTIGO 19° - Nenhum colono pode dirigir representações e queixas em seu nome ou de outros ao Presidente da Província, ou a qualquer autoridade nacional ou estrangeira (não compreendendo neste número as judiciárias nem os seus respectivos cônsules e agentes diplomáticos), sem ser por intermédio do Diretor, e com prévia informação deste; e quando aconteça que algum colono tenha a queixar-se do próprio Diretor, remeterá a queixa ao Vice-Diretor, que a formará e a enviará ao governo sob sua expressa responsabilidade no prazo de três dias.

ARTIGO 20° - Acontecendo que algum colono ignorante da língua portuguesa seja chamado por questão civil, policial ou criminal, perante alguma autoridade que não resida em Petrópolis, o diretor poderá nomear pessoa que acompanhe o colono e sirva de intérprete, informando ao mesmo Diretor do que acontecer, para que este possa levar tudo ao conhecimento a Presidência, quando assim convenha.

ARTIGO 21° - O Diretor em execução do presente regulamento escolherá, entre os empregados existentes, os mais aptos para os encargos designados, e se sobrarem alguns, serão eles agregados à 1ª Seção das Obras da Estrada Normal da Estrela cujo chefe os empregará como melhor parecer, representando ao governo quando o não possa fazer com utilidade pública, a fim de que o governo resolva a tal respeito.

ARTIGO 22° - Os empregados que dependem da confirmação do governo solicitarão na secretaria seus respectivos títulos.

ARTIGO 23° - O Vice-Diretor fará o pagamento aos colonos, mandando receber no Tesoureiro da Colônia e Seção as respectivas quantias para esse fim; e fica sendo regra invariável que o pagamento se fará individualmente, passando cada colono quitação nos livros do ponto, e assinando as tabelas de descontos.

ARTIGO 24° - As contas e férias serão organizadas no fim de cada mês, e todas rubricadas pelo Diretor, pelo respectivo escrivão, engenheiro-condutor, apontador e fornecedor.

ARTIGO 25° - Ao Diretor compete fixar o jornal dos operários, mestres e colonos, servindo de regra que – nenhum operário menor de 12 anos de sexo masculino, e de 15 anos de sexo feminino, será admitido; que o jornal de um trabalhador simples variará segundo a idade, circunstancia e sexo, de 400 réis a 1$200; o de um trabalhador de oficio, de 1$100 a 2$400; o de um mestre de oficio, de 2$200 a 3$000; que operários de sexo feminino só serão admitidos por motivo grave e exceção; que da mesma família não se admitirá mais que dois, quando muito três operários; que os trabalhos da Colônia e Seção serão interrompidos durante uma semana em cada mês.

ARTIGO 26° - A Caixa de Socorro Mútuo, instituída em Petrópolis será regida por um conselho composto de todos os empregados da Colônia e Seção, dos mestres de escola provisórios e dos burgomestres. As contribuições mensais serão de 200, 400 ou 600 réis, sendo voluntária para os colonos e pessoas não empregadas em obras imperiais ou provinciais, e obrigativa para os mais. Segundo as circunstancias de cada individuo ou família, o conselho fixará a respectiva contribuição, a qual poderá ser alterada uma vez que tenham mudado as circunstancias que a determinaram. O Conselho formará a tabela dos socorros. Nenhuma socorro será dado sem guia assinada por um empregado, burgomestre, e rubricada pelo Diretor ou Vice-Diretor. O conselho regulará a escrituração e prestação de contas a aplicação dos fundos e se reunirá no ultimo domingo de cada mês e todas as vezes que o Diretor o julgar conveniente, para deliberar sob presidência do mesmo Diretor acerca dos negócios e interesses gerais da Colônia.

ARTIGO 27° - Ao Diretor compete, como chefe da 2ª Seção, esforçar-se em que se conclua quanto antes a parte da estrada normal da Estrela compreendida entre o Palácio Imperial e a ponte do Penedo, na Serra Nova; essa parte a que medeia entre o Palácio Imperial e Itamarati, ficam reservadas para serem feitas pelos colonos alemães.

ARTIGO 28° - O Diretor apresentará no fim de cada ano um relatório circunstanciado do estado da Colônia, das obras colônias e da Seção da 2ª Estrada Normal da Estrela, e as tabelas estatísticas do estilo.

ARTIGO 29° - Do 1° de julho próximo em diante começarão os descontos a favor da Província, para a amortização da divida contraída pelos mesmos colonos. Quanto aos colonos empregados em obras imperiais e provinciais, se fará o desconto na forma dos contratos respectivos, na ocasião do pagamento de seus salários; e quanto aos que não trabalharem em tais obras designará o Diretor a quantia que eles, à vista de suas ocupações e circunstâncias possam razoavelmente pagar mensalmente; e exigir do locatário ou locador de serviços o mesmo pagamento.

ARTIGO 30° - O Diretor pode em casos graves suspender por oito dias de suas funções, aos empregados nomeados definitivamente pelo governo, dando logo parte do motivo da suspensão; mas somente perderão os empregados assim suspensos, seus vencimentos.

ARTIGOS 31° - O Diretor pode mandar riscar até três dias por mês aos empregados cuja nomeação não depende do governo, e mesmo prende-los durante igual tempo; e riscar três dias e prender até oito dias de os colonos e operários da Seção, caso o julgue necessário para puni-lo e faltas maiores; e sempre que lhe pareça útil e conveniente, reduzir ao mínimo o jornal de um operário ou mestre, colono ou não colono, negligente, relaxando, preguiçoso, desordeiro ou imoral; e poderá mesmo excluí-lo por tempo limitado ou ilimitado da Colônia e Seção, trazendo essa exclusão a perda de quaisquer benefícios que sejam liberalizados aos demais colonos.

Petrópolis aos 26 de Maio de 1847
Ass. Dr. José Maria Silva Paranhos, Vice Presidente.

Fonte:
Arquivo da Casa Imperial, Documento n° 5.403, maço 110 – Museu Imperial

domingo, 5 de maio de 2013

INAUGURAÇÃO DA TORRE DA IGREJA LUTERANA

Tribuna de Petrópolis
Terça-feira, 23 de junho de 1903
 ANO 2  – NUM. 58
p.2

A torre evangélica

 Nun danket alle Gott! eis o titulo do bello choral entoado antehontem no templo evangelico desta cidade em louvor ao Creador por centenares de pessoas, que ahi foram assisitir ao solemne culto divino celebrado em commemoração da inauguração da bella obra, que honra não só á Communidade Evangelica como a todos aquelles que, com seus óbulos sem distinção de crença, concorreram directam ou indirectamente para a elevação de tão imponente monumento em gloria do Altissimo.
 O auspicioso facto causou geraes alegrias no seio dos habitantes desta cidade que, em demonstração de seu jubilo, correram em massa á assistir as festas celebradas antehontem no magestoso templo que se ergue na avenida Ypiranga, em honra de Deus.
 E se nestas linhas descrevemos o que presenciamos na festa, justo se torna não esquecer, que, por entre nanifestaçoes de prazer e jubilo o nobre sentimento de gratidão não deixou também de ser manifestado.
 Gustavo Geisler, o modesto e digno sacerdote, della se tornou credor e por isso tivemos occasião de ouvir os unânimes louvores e o profundo reconhecimento tecidos aquelle que, como bom pastor, soube congregar elementos que compõem a Communidade  Evangelica desta cidade e no seio da qual se tornou um benemérito, e por isso alvo de geraes symtapathias e affectos.
 Passaremos agora a descrever as soleminidades que tiveram por assistentes milhares de pessoas de todas as classes sociais.
 - Sabbado, ás 6 horas da tarde, ao som de vários choraes, entre os quaes o Nun dankt alle Gott, tocados do alto da torre que se achava embandeirada, repicaram os tres sinos annunciando a sua inauguração e a do novo edifício, sendo soltadas nesta ocasião innumeras gyrandolas.
 - Domingo, o verdadeiro dia da festa, ás 10 horas da manhã realizou se no templo solemne culto divino.
 Ao contrario dos outros dias, o interior do edifício achava-se decorado com simplicidade.
 Palmas, camélias e outras flores naturaes ornavam o altar, o púlpito e a pia baptismal, vendo-se tambem sobre os dous primeiros ricos tapetes de velludo bordados a ouro, sendo estes enfeites collocados por diversas senhoras da commissão de festejos.
 Officiaram os illustres pastores Gustavo Geisler, dr. Gruel e Zink, tendo estes últimos chegado expressamente da Capital Federal e de Juiz de Fóra, para tomar parte da ceremonia.
 Após os cantos entoados pela Communidade e acompanhados ao órgão pelo sr. F. Standacher, assomou ao púlpito o sr. pastor dr. Gruel que, durante uma hora seguramente prendeu attenção do auditorio, pronunciando notável sermão.
 Em seguida, os pastores Zink e Geisler proferiam diversas orações.
 Gentilmente tomaram parte na solemnidade o coro mixto, composto de distictas damas e cavalheiros, e o corpo de cantores do Sangerbund Eintracht, este sob a direção do venerando professor Friedrich Stroele.
 Antes de findar a ceremonia o sr. pastor Geisler pronunciou palavras de agradecimento a todos que cooperaram para a construcção da torre, assim como ás pessoas e corporações que assistiram á festa.
 Entre as pessoas presentes, notamos, além de representantes de toas as classes, os srs dr. Hermogenio Pereira da Silva, presidente da Camara Municipal, que com os vereadores dr. Barros Franco Junior e coronel José Land, representou a mesma corporação, dr. Hainel, secretrio da legção allemão, plo respectivo ministro von Treuther, e commissões da Guarda Nacional, do Deustescher Verein, Cecilie Verein, Harmonie Mozerthal, Bruderbund, Turverein Petropolis e Sangerbund Eintrancht, que compareceu incorporada e com seu estandarte.
 Da imprensa compareceram os sr. Edmundo Hees pelo Nacrichten e um dos redactores desta folhas.
 - Ás 3 horas da tarde teve inicio a grande festa popular no Salão Floresta.
 A conforme noticiamos esta festividade constou de leilão de prendas Kermesse e sorteio de 400 prendas, entre os quaes figuravam objetos de arte e de valor, e isto em numero considerável.
 Foram tambem vendidos durante a festa innumeros exemplares da photografia da torre e as medalhas commemorativas, cunhadas pela antiga e conhecida casa Rittmeyer. Umagentil commissão de senhoras e senhoritas, cujos esforços em prol do êxito da festa foram extraordinários, vendia flores, tirava espórtulas em salvas e apurava por outros meios donativos para auxiliar a nobre idéa.
 O baile, durante o qual tocou a banda de musica Filhos do Euterpe, esteve animadíssimo, se bem que a compacta multidão alli reunida difficultasse um tanto as dansas.
 Na melhor ordem e sem que houvesse um incidente que pertubasse a harmonia, que reinou de principio a fim, terminou ás 3 horas da manhã.
 - Á 1 hora da tarde, realizou-se no Hotel Rio de Janeiro um banquete offerecidoaos srs. Pastore Gustavo Geisler, dr. Gruel e Zink pela commissão de festejos, tomando parte nelle varios cavalheiros e senhoras.
 Os brindes de honra foram levantados pelos srs. Hainel, secretario da legação allemã, ao imperador Guilherme II e major Carlos Hamann ao sr. dr. Rorigues Alves, presidente da Republica Brazileira.
 - Encerrando aqui a esta noticia resta-nos saudar á commissão de senhoras, senhoritas e cavalheiros pelo brilhantismo de todo festival.

Foto de 1960